PE. LEOPOLDINO MATEUS
O Pe.
Leopoldino Mateus nasceu na Póvoa de Varzim em 9 de Janeiro de 1879,
na Rua da Assunção, junto ao Castelo, e aí faleceu em 27 de Janeiro
1966. O seu pai chamava-se Francisco Rodrigues do Mateus e foi
alfaiate e carteiro; o nome da mãe era Josefa de Jesus. Eram gente
ligada à tradição poveira da pesca e de muito poucas posses.
Leopoldino era o mais velho de seis irmãos e o único rapaz.
O
Pe. Leopoldino em 1899 quando acabou o curso teológico.
Até
recentemente, só se evocava este sacerdote para dar conta da sua
intervenção junto da Beata Alexandrina; agora, a perspectiva
alargou-se e é possível falar dele como pároco de Balasar, como
pároco em concreto da Beata Alexandrina, como coadjutor da Póvoa de
Varzim, como jornalista e homem de cultura.
É
muito elucidativa a apresentação que o jornal poveiro A Defesa
fez dele nos seus 50 anos. Veja-se parte do que se escreveu ao
centro da primeira página, em 20 de Janeiro de 1929, sob o título
“Pe. Leopoldino Mateus”.
Em
1885 matriculou-se na Escola Camões, em que era professor o Sr.
Joaquim Francisco Fernandes Cunha, e em 1886 foi transferido para a
Escola Gomes de Amorim (Pereira Azurar), em que era professor o Sr.
José Alves Vieira, de saudosa memória.
Tendo
feito o exame de Instrução Primária no Liceu de Braga, em Abril de
1890, e destinando-se à carreira eclesiástica, entrou em Outubro do
mesmo ano para o Seminário de Santo António e S. Luís Gonzaga, onde
frequentou o curso de preparatórios, que concluiu em Julho de 1895.
Por
falta de idade, só entrou em Outubro de 1896 para o Seminário
Conciliar de Braga, onde concluiu o Curso Teológico em Junho de
1899. Foi professor no Colégio de S. Joaquim, em Chaves, de 1900 a
1901, e celebrou a sua primeira missa na Igreja Paroquial desta vila
(Póvoa de Varzim) no dia 28 de Setembro de 1901.
1.
Antes
de vir para Balasar
E
continua o artigo, para falar dele já como sacerdote:
No dia
1 de Janeiro de 1902, entrou para capelão do Senhor dos Navegantes,
nas Caxinas, até Outubro de 1906, em que foi admitido como capelão
da Confraria das Almas, onde se conserva.
A 8 de
Agosto de 1908, foi nomeado pelo saudoso Prelado D. Manuel Baptista
da Cunha coadjutor desta vila, lugar que tem desempenhado com zelo e
actividade, ininterruptamente, durante a paroquialidade dos
Reverendos Priores Manuel Martins Gonçalves da Silva, José Martins
da Silva Gonçalves, Álvaro de Campos Matos, Aurélio Martins de Faria
e Alexandrino José Leituga. Tendo-se dedicado à pregação, já tem
percorrido uma boa parte do norte do país, onde tem sido muito
apreciado.
Retrato
do Pe. Leopoldino existente na sacristia da Matriz da Póvoa de
Varzim.
Nas
corporações religiosas já foi, durante algum tempo, juiz da
Confraria de Nossa Senhora do Rosário e segundo secretário da
Senhora de Lourdes e Mesa da Associação do Coração Agonizante de
Jesus; fez parte da Comissão da Senhora do Desterro, dando-lhe
grande impulso, e hoje é membro da Comissão de Santo António, da
Matriz. Em corporações civis, foi presidente da direcção da
Associação de Socorros Mútuos (A Povoense), em 1907, salvando-a do
perigo que a faria soçobrar, mais do que uma vez presidente da
assembleia-geral da mesma e presidente do conselho fiscal, durante
dois anos, da Mutualidade. É o actual presidente da assembleia-geral
da Fúnebre Familiar e foi presidente do conselho fiscal da
Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários durante o biénio
findo.
De
Julho de 1912 a Junho de 1917 foi presidente da direcção da
Associação de Caridade A Beneficente, cargo em que desenvolveu um
carinho e dedicação exemplar pela causa dos pobrezinhos e durante
alguns anos foi membro activo da Conferência de S. Vicente de Paulo.
Dedicando-se ao jornalismo é redactor efectivo do considerado
semanário local “A Voz do Crente”, colaborador do nosso semanário e
do “Comércio da Póvoa de Varzim”, do “Mensageiro Eucarístico”
de Braga e correspondente do importante diário católico de Lisboa
“As Novidades” e do semanário do Porto “A Ordem”. Tem feito parte de
diversas comissões festivas, principalmente da Festa Marítima, em
que tem revelado o seu amor pela Póvoa.
O nosso
estimado colaborador foi muito cumprimentado no dia das suas bodas
de ouro, tendo havido na Igreja Matriz missa e grande comunhão pelo
seu aniversário natalício – 50 anos. Fazemos votos ao Céu pelo
prolongamento da sua preciosa e estimada existência. J.A.M.
N’A
Voz do Crente de 4 de Janeiro escrevera-se, depois de o Pe.
Leopoldino ser declarado “orador sagrado, ilustre e primoroso
jornalista e nosso colaborador assíduo e dedicado”:
No
desempenho das funções do seu ministério, o Rev. Leopoldino Mateus,
diligente e canseiroso, desenvolve uma actividade pasmosa e modelar.
Apesar disso nunca o tempo lhe falta para nos prestar os seus
valiosos e apreciáveis serviços.
A
redacção aproveita o ensejo para lhe tributar o seu “agradecimento
pela sua boa colaboração e prestar-lhe a nossa solidariedade
jornalística contra as insinuações baixas e torpes com que alguns
pretensiosos, cheios de orgulho e presunção, têm tentado ofuscar o
brilho das suas primorosas crónicas, cheias sempre da mais sã
doutrina”.
Infelizmente, não se esclarece nas transcrições o papel que o Pe.
Leopoldino teve nas duras lides jornalísticas dos primeiros anos da
República. Só para se fazer uma apagada ideia do que isso foi, ao
menos nos anos mais quentes do confronto da República com a Igreja,
leia-se o que segue. No começo de Janeiro de 1912, quando o Pe.
Leopoldino completava 32 anos, O Poveiro, de que era
colaborador, anunciou o seu aniversário e deu-lhe os parabéns:
Os
nossos parabéns vão não só a ele, que ele tudo merece, mas a seu
extremoso pai e a sua família, que o não esquecerá. Ao padre
Leopoldino Mateus, acérrimo defensor das doutrinas da Igreja, um
apertado abraço e muitos anos de vida na boa carreira que segue em
honra da nossa terra.
O
Intransigente,
jornal republicano radical, achou por bem tirar estas
inqualificáveis conclusões da delicada saudação:
1 –
Que o Padre Leopoldino fez anos, no dia 7 de Janeiro, que se
resolveu vir visitar a luz do sol a este mundo;
2 –
Que tem sido um bom camarada do Laurindo, do Prior e dum outro
imbecil a quem chamam Alfredo Fernandes da Silva, o Fresco, espécie
dum nojento trapo arremessado a uma sarjeta, coadjuvando-os nas
escabrosidades da cloaca jornalística;
3 –
Que, para honra da crença professada por aquela merdífera raça de
gentalha, a companhia do padre Mateus é indispensável e
insubstituível;
4 –
Que, por tudo isso e pelo mais que não souberam dizer, engasgados
como ficaram, pelo taco das grandes comoções, o padre Mateus teve de
pagar algumas canecas de vinho e receber os mil e um parabéns da
pitoresca confraria.
Pois
receba, agora, o padre Leopoldino Mateus também as nossas
felicitações, pelo seu aniversário natalício, e continue a
deliciar-nos com as caldeiradas do seu engenho e arte de escrever
“relâmpagos”, que parecem “frescas” baboseiras de fadista
aperaltado; “secções alegres”, destinadas a anavalhar,
caluniosamente, a honra alheia e “críticas de tacão”, para rebaixar
os sentimentos dos democratas e enaltecer as “virtudes” dos
milhafres da grei jesuítica. E tudo em nome de Deus?!...
Esta
linguagem (que infelizmente ainda é possível encontrar hoje em
certos meios) comenta-se a si mesma; mas a elevação d’O
Poveiro era conhecida, tanto que em tiragem ultrapassava de
longe os outros semanários da terra e aos poucos projectava-se como
de dimensão nacional, quando os republicanos o silenciaram.
Alude-se no escrito a rubricas jornalística atribuída ao Pe.
Leopoldino, mas não é garantido que essa atribuição corresponda à
verdade.
Este
exemplo de torpezas com se queria ferir o bom nome do Pe. Leopoldino
não foi caso único: repetiu-se no mesmo jornal e está nas
declarações prestadas pelos republicanos radicais por altura do
complô monárquico[2].
Mas
ele não parou de escrever para os jornais. Em 13 de Fevereiro de
1920, A Sentinela informava que ele era “assíduo colaborador”
d’O Liberal.
Por
altura do II Congresso Eucarístico da Arquidiocese de Braga, que
teve lugar na Póvoa de Varzim, em 1925, publicou-se então um
opúsculo, que era uma espécie de número único de revista. O Pe.
Leopoldino, que foi o secretário desse Congresso, colaborou com um
artigo intitulado “A Fé dos Poveiros”. Escreveu ele:
Mais
uma vez, a religiosa vila da Póvoa de Varzim, por ocasião do
Congresso Eucarístico, vai mostrar a Portugal inteiro que a sua fé
em Jesus é viva e fervorosa e que os seus corações consagram a
Jesus-Hóstia a mais sincera das dedicações.
Como a
maior parte da população pertence à classe piscatória, são os filhos
do mar, os humildes poveiros, que vão tomar parte activa nas grandes
solenidades que se realizam por essa ocasião.
Não é
de hoje a fé dos poveiros a Jesus Sacramentado; herdaram esses
sentimentos dos seus maiores, que tiveram sempre o cuidado de, com o
seu exemplo e com os seus conselhos, incutir no ânimo dos filhos a
sua crença em Jesus e a sua devoção à Virgem da Assunção.
Na
capela da Lapa, erigida pelos valentes pescadores em honra da sua
augusta padroeira, Maria Santíssima, conservam o SS. Sacramento, a
quem não deixam de prestar homenagens da sua piedade e amor filial.
Alguns
anos houve até que, na segunda-feira de Páscoa, era promovida uma
festa em acção de graças ao Senhor Sacramentado pelos benefícios
concedidos durante o ano. […]
Depois, como no actual regime fosse proibido levar o Sagrado Viático
aos doentes, parece que tinha esmorecido a fé dos poveiros a
Jesus-Hóstia, mas não! Veio a Arquiconfraria dos Pajens do SS.
Sacramento arregimentar as criancinhas, para, aproximando-as do seu
Criador, haurirem nessa fonte salutar graças copiosíssimas e bênçãos
salutares.
Como
Jesus deve estar contente com esses humildes poveirinhos que, de tão
pouca idade, amam já o seu Jesus, recebem-No com frequência e
adoram-No com afecto.
Como
Jesus deve estar alegre, porque nessa capela muitas vezes, pela
ausência de fiéis, entregues às lides domésticas, o Manso Cordeiro
estava só, tendo frio, apesar de ter formado o Sol, porque lhe
faltava o calor dos corações; padecia sede, apesar de ter feito
aparecer todas as águas, porque estava sequioso do bem das almas;
sentia necessidade, sendo seus todos os alimentos e todas as
riquezas, porque lhe escasseavam as almas que O recebessem
dignamente e onde pudesse viver e reinar.
Agora,
procurado e rodeado de crianças que O amam e louvam, recebem e
adoram, como Jesus deve estar bem, como Jesus deve estar satisfeito!
Já tem quem O siga, já tem quem O conheça! E, que não têm sido
infrutíferos os trabalhos desta Arquiconfraria, bem o mostram essas
festas sumptuosas, essas apoteoses brilhantíssimas a
Jesus-Eucaristia que têm agitado tantos corações e movido tantas
almas a aproximarem-se de Jesus, recebendo-O com fé, adorando-O com
entusiasmo e amando-O com afecto.
Outrora, eram os pais que ensinavam os filhos, com o seu exemplo e
com as suas lições, a amar, conhecer e respeitar o Pai do Céu;
hoje, são os filhos que com o seu procedimento ensinam aos pais que
não basta, para amar Jesus, ter fé, é necessário ter o coração puro
– “Felizes os corações puros, porque eles verão a Deus!” – recebê-Lo
com frequência e defendê-Lo com ardor.
É por
isso que não podíamos deixar de nos associar a esta homenagem das
criancinhas a Nosso Senhor Sacramentado por ocasião do Congresso
Eucarístico, fazendo votos pela conservação desta piedosa associação
que tanto bem faz às almas e pelo bom êxito das festas Eucarísticas
para que se acenda cada vez mais a fé dos poveiros e traga ao
aprisco do Senhor tantas ovelhas cegas e ingratas que dele vivem
afastadas.
Este
escrito eucarístico não deixa de ser curioso pois em breve o seu
autor vai ser pároco duma “vítima da Eucaristia” a quem levará
diariamente a Comunhão ao longo de dezoito anos.
Em 20
de Maio de 1923, n’O Liberal, ele assinara um outro
artigo de homenagem ao falecido Pe. Álvaro de Matos.
Na
hora dos elogios
Se
noutros tempos, o Pe. Leopoldino, com os seus colegas d’O
Poveiro, haviam sido alvo das chufas mais vis, ia chegar para
ele a hora dos elogios. Foi assim n’A Propaganda, de 17 de
Julho de 1933, pouco mais de uma semana após ele tomar conta da
paróquia de Balasar.
No dia
9 de Julho tomou posse da paroquialidade de Balasar, deste concelho,
o nosso prezado amigo e conterrâneo Sr. Pe. Leopoldino Rodrigues
Mateus. Deixando a sua terra e os seus venerandos pais, o novo
pároco vai cumprir uma missão de paz e religiosidade, confiada pelo
seu Prelado, que tem pelo nosso amigo a maior estima e consideração
pelos relevantes serviços prestados à Igreja.
Foi
muito sentida a ausência deste ilustre sacerdote, que se impôs pelo
seu zelo e dedicação à Igreja e pelo seu bairrismo, sempre devotado
à causa da sua terra. Como capelão da Confraria das Almas, onde
esteve durante 27 anos, calcorreando as ruas todas as madrugadas,
quer chovesse quer ventasse, de dia e de noite, intensificou esta
devoção, que é hoje muito fervorosa.
Como
capelão interino da devoção da Senhora do Desterro aumentou a
frequência daquela pequena capela, convertendo-a no centro de
fervorosa piedade. Como coadjutor ou vigário cooperador da freguesia
da Póvoa de Varzim, cargo que desempenhou com zelo e actividade
durante 24 anos, prestou bons serviços à causa da Igreja Católica,
de que é digno ministro.
Por
isso, não admira que o povo crente da Póvoa o estimasse e
respeitasse, porque sabia a falta que faz no nosso meio religioso e
social. Deixou a nossa Varzim e foi cumprir uma missão delicada para
a importante freguesia de Balasar, deste concelho. Ao celebrar a sua
primeira missa paroquial, as suas palavras de saudação calaram de
tal forma no ânimo dos seus novos paroquianos que todos atentos e
visivelmente satisfeitos foram cumprimentar o seu novo abade.
Vai
grande regozijo na freguesia de Balasar pela estadia do seu novo
Pastor, a quem já tributam respeito, estima e consideração,
esforçando-se por conservar o mais tempo possível. Sua Reverência
cumpre um dever de obediência aceitando aquele lugar espinhoso e
trabalhoso, é de esperar que o povo de Balasar, respeitador e
crente, estime o seu novo Pároco, que é um dos sacerdotes mais
trabalhadores e honestos da nossa terra.
Que a
saudade que o povo da Póvoa tem pelo seu ex-coadjutor e amigo
dedicado seja compensada pela benevolência e estima com que é
tratado na sua nova freguesia. Ao Sr. Abade de Balasar, todos os que
aqui trabalham na redacção enviam os seus respeitosos cumprimentos.
2.
Em
Balasar
O Pe.
Leopoldino veio com certeza para pacificar a freguesia que andava
agitada. O episódio do apedrejamento dos protestantes deve ter tido
um efeito muito nocivo, e não foi exemplo único do desnorte da
paróquia.
A sua
actividade anterior na Póvoa de Varzim proporcionara-lhe o
conhecimento do Pe. Mariano Pinho, que residira alguns anos no Largo
das Dores. Inclinado a dar uma muito particular atenção às crianças,
natural é que, chegado a Balasar, o Pe. Leopoldino convidasse este
jesuíta e ambos aí promovessem a criação da Cruzada Eucarística das
Crianças, que ele dinamizava a nível nacional. O Pe. Mariano Pinho
era um padre doutor, que tinha vindo havia poucos anos do
estrangeiro, e também do exílio, sábio como poucos. Por isso, em
Balasar, a acção conjunta destes dois dedicados sacerdotes, que teve
lugar em 16 de Agosto de 1933, redundou num êxito.
A ida
do Pe. Mariano Pinho a Balasar está muito bem documentada: regista-a
a Cruzada, regista-a um livro de actas do cartório paroquial
e regista-a ainda uma notícia do jornal A Propaganda, além
Autobiografia da Alexandrina.
A
notícia d’A Propaganda é a do primeiro noticiário que
transcrevemos.
Estudo histórico sobre a Santa Cruz
Em
finais de 1933, começa a ser publicado n’A Propaganda
um estudo sobre a Santa Cruz de Balasar cujo autor assina apenas por
Z. Quem poderia ser o autor deste longo trabalho que o Pe.
Leopoldino, muito mais tarde, quando escreve os seus dois artigos
para o Boletim Cultural Póvoa de Varzim, não menciona embora
fale também da Santa Cruz?
Era
certamente o próprio Pe. Leopoldino. Bem vistas as coisas,
dificilmente podia ser outra pessoa, pois a investigação implicava o
conhecimento do documento que existe no cartório paroquial. Mas a
confirmação, a nosso ver, encontra-se quando se compara a versão do
trabalho saído n’A Propaganda com a que foi mais tarde
publicada no Boletim Cultural. A segunda decalca e completa a
primeira.
Esse
foi pois o primeiro contributo cultural que ele deu para o estudo da
história de Balasar.
No
segundo dos artigos de 1933, há umas frases que convém lembrar:
Pena
foi que o povo laborioso e crente de Balasar não celebrasse no ano
pretérito a festa comemorativa do primeiro centenário da célebre
aparição que tanto nome deu à freguesia, pelos milhares de
forasteiros que a foram visitar e pelas grandiosas festas celebradas
em sua honra.
Acontecimentos estranhos à sua vontade frustraram essa comemoração,
debalde lembrada pelo nosso colega Baptista de Lima em diversos
números d’O Comércio da Póvoa de Varzim. Foi pena que
tal comemoração se não efectuasse porque podia ser o ressurgimento
de uma devoção que, em tempo, foi intensa e fervorosa, não só na
classe piscatória desta vila mas também no povo crente do nosso
concelho vizinho.
Ficamos por aqui a saber diversas coisas: que não foi feita a
comemoração; que acontecimentos estranhos à vontade dos balasarenses
a impediram; que Baptista de Lima escreveu sobre essa data no
Comércio; que os pescadores poveiros e gente de Vila do Conde
costumavam acorrer às festas da Santa Cruz; que o Pe. Leopoldino
escreve, ou assim o imagina, na Póvoa.
Também
é claro que foi por iniciativa do Pe. Leopoldino que se publicou em
1936, n’A Propaganda, o cartaz a chamar os fiéis, em
especial os poveiros, para a devoção à Santa Cruz. Termina assim:
A
classe piscatória da Póvoa de Varzim, sempre piedosa e apaixonada
pelas obras de Deus, acudia assiduamente, vendo-se na maior parte
dos dias santificados grupos de poveiros, a pé e rezando, abeirar-se
da capelinha onde oravam com fervor e confiança, beijavam a Santa
Cruz, andavam em redor e, depois de tomada a frugal refeição,
regressavam à sua terra cantando os seus cânticos peculiares.
A
maior frequência de forasteiros e devotos dava-se no dia do Corpo de
Deus, aniversário da aparição da Santa Cruz, cuja festa atingiu um
brilhantismo desusado, com duas afamadas bandas de música, feérica
iluminação, lindas decorações e soberbo fogo-de-artifício. A fim de
regularizar a situação económica da capela, fundou-se a Confraria do
Senhor da Cruz que contava bastantes irmãos.
Hoje
esta devoção está um pouco frouxa sendo raros os grupos de
pescadores poveiros que acorrem a implorar graças e a cumprir
promessas. Nas paredes da pequena ermida encontram-se alguns quadros
de ex-votos, por causa de doenças, sobressaindo um de que foi
vovente o Rev. Abade de Touguinhó[3].
Daqui se vê que a devoção da Santa Cruz aparecida em 1832 em Balasar
não era só praticada pelo povo simples e trabalhador, mas também por
pessoas ilustradas e de elevada posição social.
É
necessário manter o culto da tradição e avivar no povo de hoje a fé
e religiosidade dos seus maiores que nos transes perigosos recorriam
com fé confiança ao sinal da Redenção, a Vera Cruz onde Jesus
agonizou durante três horas, longas como três séculos, e morreu para
resgate da humanidade perdida pela queda dos nossos protoparentes.
Eis o
significado deste caso oferecido à admiração e dos assistentes,
convidando-os a fazer uma visita ainda que breve à capelinha onde se
conserva a Santa Cruz aparecida em 1832.
Neste
apelo está o estilo das prédicas do Pe. Leopoldino. Afinal, o
centenário, ao menos em sentido lato, fez correr tinta, como já
documentámos.
Os
poveiros hão-de regressar mais tarde a Balasar… para visitarem e
ouvirem a Alexandrina.
Que
mais fez o Pe. Leopoldino em Balasar?
Como
correspondente para a imprensa da Póvoa, o Pe. Leopoldino
assume muitas vezes o papel dum cronista da sua terra adoptiva, que
assinala as mais diversas ocorrências que lhe chegam ao
conhecimento. Mas fá-lo anonimamente, como se fosse um balasarense a
escrever, numa atitude muito construtiva, que não regateia elogios a
ninguém, mesmo ao pároco...
O Pe.
Leopoldino, em Balasar, prega, chama outros pregadores e animadores
de renome para as festividades e para assistir as associações
religiosas, faz discursos na escola, cria ele mesmo associações
religiosas… Uma dedicação exemplar!
Com os
artigos históricos sobre Balasar que fez sair n’A
Propaganda e no boletim Póvoa de Varzim, este sacerdote
poveiro iniciou o estudo da freguesia que paroquiou. Embora se tenha
fixado num período temporal bastante recente, o trabalho tem um
inegável mérito e supõe uma recolha de informação variada.
Os
noticiários semanais que fez sair nos jornais da Póvoa entre 1933 e
1956 são uma fonte indispensável para conhecer Balasar e a
movimentação gerada em redor da Alexandrina. Conservam-se perto de
500.
3.
Outras
intervenções na imprensa poveira
Ao tempo em que paroquiava Balasar, intervenção do Pe. Leopoldino na
imprensa poveira não se limitou aos noticiários. Publicou vários
escritos no geral de teor moralizante sobre estes temas: o Natal,
contos do Natal, escritos marianos, escritos de atenção aos
necessitados e temas vários.
O
tema do Natal mereceu ao Pe. Leopoldino pelo menos estes
artigos: “O Príncipe da Paz” (O Comércio da Póvoa de Varzim,
23/12/1946), 1942), Festa do Natal (O Comércio da Póvoa de Varzim,
18/12/1943), “Rei da Paz” (Idea Nova, 22/12/1945) e “O Natal”
(Idea Nova, 23/12/1946).
Nos
jornais e números seguintes saíram escritos com o título de Conto
do Natal que pensamos que foram da autoria do Pe. Leopoldino
(ele apenas assina um):
A
Propaganda,
23/12/1934: Conto do Natal; A Propaganda, 15/01/1939: Conto
do Natal; A Propaganda, 17/12/1939: Conto do Natal; A
Propaganda, 24/12/1941: Conto do Natal (incompleto); A
Propaganda, 27/1/1943: O Presépio (Conto do Natal); O
Comércio da Póvoa de Varzim, 20/12/1943: Conto do Natal; O
Comércio da Póvoa de Varzim, 28/12/1944: Tempos Idos, Conto do
Natal; O Comércio da Póvoa de Varzim, 22/12/1945: Conto do
Natal; Idea Nova, 22/12/1945: Conto do Natal, Noite Santa;
Idea Nova, 23/12/1946: Conto do Natal; Idea Nova,
20/12/1947: Conto do Natal; Idea Nova, 24/12/1948: Conto do
Natal; Idea Nova, 23/12/1950: Consoada de Mariette, Conto do
Natal; Idea Nova, 22/12/1951: Conto do Natal; Ala Arriba,
24/12/1955: Conto do Natal; Ala Arriba, 22/12/1956: Conto do
Natal; Ala Arriba, 21/12/1957: Conto do Natal.
Do
tema mariano, destacamos estes artigos: “A nossa Virgem” (A
Propaganda, 1/9/1949), “15 de Agosto” (O Comércio da Póvoa de
Varzim, Agosto de 1940), “Rainha da Paz” (Idea Nova,
8/12/1945), “A Póvoa de Varzim e o Coração Imaculado de Maria” (Idea
Nova, 24/8/1946), “Maria Virgo Assumpta est ad Aeternum
Thalamum” (Idea Nova, 14/8/1948), “Nossa Senhora das Dores” (Idea
Nova, 15/9/1948), “A Padroeira da Póvoa de Varzim” (Idea Nova,
4/12/1948), “Senhora de Portugal” (Idea Nova, 3/12/1949),
“Nossa Senhora das Dores” (Ala Arriba, 14/9/1957) e “As Sete
Dores de Nossa Senhora” (Ala Arriba, 20/9/1958).
Dos
escritos que manifestam a sua atenção aos necessitados,
anotamos: “Magnífico Gesto” (O Comércio da Póvoa de Varzim,
17/7/1943), “Cortejo de Oferendas” (O Comércio da Póvoa de Varzim,
28/8/1943), “O Dia do Hospital” (O Comércio da Póvoa de Varzim,
11/9/1943), “Bombeiros da Póvoa” (O Comércio da Póvoa de Varzim,
13/5/1944), “A Beneficente” (O Comércio da Póvoa de Varzim,
13/5/1944), “A Escola” (O Comércio da Póvoa de Varzim,
1/7/1944), “A Bem da Humanidade” (O Comércio da Póvoa de
Varzim, 8/7/1944), “Muito Bem” (O Comércio da Póvoa de Varzim,
Julho de 1944), “A Causa dos Pobres” (Idea Nova, 15/12/1945)
e “A bem dos doentes” (Idea Nova, 16/10/1948).
Entre
os artigos em que aborda temas vários, salientamos: “O nosso
Presidente” (sobre Salazar, Idea Nova, 12/1/1946), “Bodas de
Oiro” (sobre o Pe. José Cascão, Idea Nova, 24/7/1948), “Herói
e Santo” (sobre D. Nuno Álvares Pereira, Idea Nova,
6/11/1948), “Igreja de S. José de Riba-Mar” (Ala Arriba,
14/3/1953, e outro com o mesmo título e no mesmo jornal em 18 de
Abril).
“Santa
Eulália de Balasar”
Alguns
anos depois de voltar para a Póvoa, em 1958 e 1959, o Pe. Leopoldino
fez sair no Boletim Cultural um trabalho histórico sobre Balasar que
intitulou “Santa Eulália de Balasar” e dividiu em “Ensaio de
Toponímia” e “Milagre da Santa Cruz”. Prestou com ele um grande
serviço cultural à freguesia. Como sobre a Santa Cruz já nos
alongámos no livro que lhe dedicámos, vamos agora dizer algumas
palavras sobre o “Ensaio de Toponímia”, de que também já
repetidamente nos servimos.
O
autor conhecia bem a freguesia, conhecia o terreno e conhecia as
pessoas, como tantas vezes deixa claro nos noticiários. A esse
conhecimento ajuntou alguma informação colhida em fontes orais, na
Acção Católica (Boletim Arquidiocesano e Revista de Cultura)
e numa ou noutra fonte escrita, principalmente da imprensa periódica
poveira.
O
valor do trabalho realizado é inegável: pela primeira vez abriu-se
uma janela sobre o passado da freguesia.
Quanto
à imprensa periódica poveira, são transcritos vários artigos de
jornais relativamente recentes. Mas há ao menos uma fonte de que se
serviu e que não citou, copiando trabalho alheio e dando-o como
fruto de investigação sua.
Efectivamente, ao falar das Fontainhas e ao historiar o
caminho-de-ferro, páginas 187 e 188, ocupa uma página com cópia
literal do artigo de Cândido Landolt “O Comboio da Póvoa” que abre o
número 18, da revista Póvoa de Varzim, 1.º ano, 1912.
Este
caso do Ensaio de Toponímia, cujo alcance não se deve exagerar,
talvez se repita num ou outro artigo de jornal.
4.
À
Memória de Alexandrina Maria da Costa
Semana
e pouco após a morte da Alexandrina, quando todos dela guardavam
viva memória mas ainda não havia livros que lhe fixassem a
biografia, o Pe. Leopoldino exaltou-a neste In Memoriam:
Na
freguesia de Balasar deste concelho baixou à paz do túmulo
Alexandrina Maria da Costa “Vicente”, tão conhecida, pelo menos de
nome, em quase todo o País.
Nasceu
a 30 de Março de 1904 e faleceu a 13 de Outubro de 1955, isto é,
nasceu no ano de Nossa Senhora (ano do 50.º aniversário da definição
dogmática da Imaculada Conceição) e faleceu no dia da mesma Senhora,
no dia último das suas aparições aos Pastorinhos de Fátima.
Recebeu a primeira Comunhão na Igreja Matriz de Nossa Senhora da
Conceição da Póvoa de Varzim e recebeu os ú1timos Sacramentos
administrados por um sacerdote poveiro, o seu pároco.
Diz-se
de Nosso Senhor no seu Evangelho que passou a vida fazendo bem; da
saudosa Alexandrina também se pode garantir que passou a sua vida
espalhando benefícios.
De
todos os donativos que alguns visitantes lhe deixavam
espontaneamente, nada queria para si, distribuía-os pelas igrejas e
pelos necessitados e pelas missões.
É
conhecida a história da sua vida; era uma humilde pastorinha do
campo quando, qual outra Goretti, perseguida para fins criminosos,
não encontrou outro meio de escapar do crime do que lançar-se de uma
janela ao quintal, o que lhe ocasionou uma doença que a prendeu ao
leito da dor perto de 40 anos e sofrendo com a maior resignação.
Era
uma alma de Deus toda entregue ao sacrifício pela conversão dos
pecadores, salvação dos moribundos e alívio das almas do Purgatório.
O
segredo da sua resignação cristã estava na Vida Eucarística, pois
que recebia diariamente o Pão dos Anjos com fervor edificante e
piedade singular.
A
Sagrada Comunhão já há bastantes anos era a sua única comida, porque
não tomava alimento algum. Nas últimas horas de sua vida, já mais do
Céu que da terra, quando a sua família chorava e soluçava,
assegurava-lhes: “Não chorem, que eu vou para o Céu”.
Sim,
Alexandrina contava ir para o Céu, mas como os desígnios de Deus são
insondáveis, é bom sufragá-la para lhe apressar o seu triunfo, se
carecer de se purificar.
O seu
funeral, a que assistiram cerca de 40 sacerdotes – e mais viriam se
soubessem ou pudessem – foi um triunfo, uma apoteose. O seu cadáver,
inumado por entre lágrimas e suspiros na terra fria, tem ainda a
visita de muitos admiradores. É uma romagem constante para sua
sepultura, uns a chorar outros a suplicar graças à Sacrificada que
já não vêem mas que acreditam estar no Céu.
Aqui
deixamos estas linhas à memória daquela que foi modelo da vida
cristã.
Literato
Conhecemos só uma pequena parte da produção jornalística do Pe.
Leopoldino. E há períodos dessa produção que seria importante
identificar e analisar: estamos a pensar no jornalismo de combate
praticado n’O Poveiro em 1911 e 1912 e na colaboração
particularmente exigente enviada para jornais de circulação
nacional.
Já se
viu acima como O Intransigente pretendeu atribuir ao Pe.
Leopoldino certas secções d’O Poveiro, como as
fantasistas crónicas intituladas “De Relâmpago” e a “Secção Alegre”.
As primeiras, porque misturavam sistematicamente prosa com verso e
tinham uma parcela de ficção muito saliente, interessam-nos
bastante. Eram assinadas pelo pseudónimo de Aeronauta e deviam
incomodar tanto que chegaram a ser parodiadas.
Mas
não nos é possível identificar o seu verdadeiro autor. Segundo O
Poveiro de 28 de Setembro de 1911, já teriam sido alvitrados
doze nomes. E o jornal conclui assim a nota em que fala do
Aeronauta:
Acordem; já era tempo de saberem quem era o Aeronauta.
O
Aeronauta… é o Aeronauta.
No
mesmo mês de Setembro, O Intransigente escreveu uma vez em
tom sarcástico:
Olha o
Padre Leopoldino
A
escrever a “Secção Alegre”…
P’ra
brunir as ferraduras
Do
Cabral tem um bisegre…[6]
A
despropositada quadra pouco ajuda no sentido de identificar com
segurança a colaboração do Pe. Leopoldino para O Poveiro e
para outros jornais. E isso ser-nos-ia muito útil para avaliarmos a
arte da sua escrita e para percebermos como ele se foi afirmando
como jornalista respeitado.
Em 20 de Dezembro de 1943, ele publicou n’O Comércio da Póvoa de
Varzim uma pequena narrativa com o título de Conto do Natal.
Trata-se duma história muito bem arquitectada: revela-se aí como um
homem experiente na escrita de ficção.
A história começa quando Nicolau, o protagonista, e a esposa, Sofia,
vivem um momento crítico, o da partida do mesmo Nicolau para a
Primeira Grande Guerra. Dão-se-nos depois os antecedentes da vida do
casal, para a seguir voltar ao tempo do início.
A acção tem um começo vulgar; surgem depois as complicações,
primeiro a do amor, vencida pela ousadia dum casamento entre pessoas
de desigual nível económico e social, depois a da guerra. Acaba
contudo em final feliz, mas um final que exigiu penoso sacrifício ao
par.
O que se nota é que o autor é expedito em manusear os ingredientes,
sejam eles o discurso narrativo ou descritivo, seja a organização
das sequências ou a vivência dos estados de espírito.
A aldeia do Minho onde moravam o Nicolau e a Sofia do conto podia
muito bem ser Balasar, onde não faltavam casas abastadas. A crítica
às exigências paternas quanto ao nível económico das noivas ou dos
noivos era muito justificada. Lembra por vezes Júlio Dinis, pela
intenção moralizante, mas tem uma feição muito própria.
Ao tempo da publicação desta história, em 1943, decorria a Segunda
Guerra Mundial; embora Portugal não participasse, ela dava-lhe
actualidade.
Cremos que pertencem ao Pe. Leopoldino vários outros contos
publicados na imprensa da Póvoa sob o mesmo título e não assinados.
A
despedida
Na
altura de deixar Balasar, o Pe. Leopoldino contava 77 anos e a sua
saúde estava muito debilitada. No artigo de 13 de Outubro de 1956 no
Ala Arriba ele conta este diálogo com a Alexandrina onde se
queixa da falta de forças e faz menção de abandonar o múnus
paroquial:
Um
dia, sentindo que as forças me iam definhando, disse-lhe:
Alexandrina, parece-me que vou deixar-vos, porque me não sinto com
alento para o pesado ónus desta longa freguesia.
A
doente calou-se, mas, volvidos alguns dias, antes de lhe dar o Pão
da Vida, ao abeirar-me do seu leito, diz-me:
“Senhor Abade, não receie perder o vigor para deixar a freguesia;
porque pedi a Nosso Senhor que eu morresse antes de V. Rev.cia nos
deixar e Ele prometeu-me que sim, e a sua palavra não falta”.
E
assim sucedeu.
Uma
fotografia tirada na altura mostra-o efectivamente muito alquebrado.
No
Verão, o Pe. Leopoldino passava sempre uma breve temporada na Póvoa,
por razões de saúde, mas sem dúvida também para cultivar as suas
amizades poveiras. Foi para lá que voltou quando deixou Balasar.
A
freguesia fez-lhe uma despedida emotiva e merecida, descerrando um
retrato seu no salão paroquial.
O
apagamento
Segundo um testemunho inserido pela Prof.ª Zulmira Linhares no
artigo que dedicou ao Pe. Leopoldino e segundo outras fontes, este
antigo pároco, que faleceu com 87 anos, passou em cruel penúria os
últimos anos da vida:
Foi
nestes dez anos finais (1956-1966) que o Pe. Leopoldino talvez tenha
passado o período mais sombrio, negro, preocupante e agreste da sua
existência. Esgotado o mealheiro, sua irmã, que com ele havia
partilhado a vida paroquial, parte pelas ruas da Póvoa a mendigar
auxílios materiais para a subsistência de ambos – a sua e a do irmão
sacerdote. Esta situação humilhante chocou-nos. Dela demos
conhecimento ao Superior Hierárquico e julgamos que o facto terá
sido atenuado, se não remediado.
Esta
situação terá sido provocada por uma sobrinha a quem ele emprestou
uma quantia avultada de dinheiro e que ela não devolveu.
Uma
notícia necrológica sobre o Pe. Leopoldino exprime-se assim a dada
altura:
Jornalista devotado, sempre presente em todas as emergências em que
a sua terra dele necessitasse, bondoso e incansável trabalhador,
deixa o saudoso sacerdote todos os seus conterrâneos na maior mágoa.
A
mesma notícia reconhece-o como “dotado de grande inteligência” e
“notável orador sacro”.
Quanto
a inteligência, sabemos que era um homem culto e que escrevia com
fluência, numa prosa corrente e de agradável leitura; sobre a sua
oratória, não é fácil hoje avaliá-la, quer porque a oratória é um
saber prático e por isso só quem o ouviu é que sobre ela se podia
capazmente pronunciar, quer porque não consta que deixasse qualquer
sermão escrito.
Do seu
espólio pessoal, disseram-nos que depois de estar durante anos ao
abandono terá ido para o lixo. Mesmo que alguém tenha tido o cuidado
de arrecadar o que nele havia de visivelmente mais valioso, terá
sido uma grande perda.
Nos 23
anos em que paroquiou Balasar, o Pe. Leopoldino preocupou-se
sobretudo com a formação religiosa e mesmo cultural dos seus
paroquianos.
Disseram-nos também que, em termos de política, soube sempre
dialogar quer com os apoiantes do regime quer com os seus
opositores, o que é notável.
Deixou
algumas obras materiais: a colocação de novos sinos na torre e da
energia eléctrica na igreja, a construção do salão paroquial e o
artístico cruzeiro da paróquia.
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