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ALEXANDRINA MARIA DA COSTA
 

CARTAS AO PADRE MARIANO PINHO
1936

Balasar, 7-1-1936

      Viva Jesus,

      Não queria que Vª Revª voltasse a sair de Braga sem saber algumas coisas de mim. Não pude escrever antes porque há dois dias que não temos correio. Pouco lhe vou dizer porque não posso, de forma nenhuma,. Digne-se Nosso Senhor aceitar-me o grande sacrifício que estou a fazer para a conversão dos pecadores. Tanto me preocupam as almas desses pobres infelizes que tanto ofendem a Jesus! Tenho tanta, tanta pena das alminhas deles! Lembrar-me que uma vez perdidas ficam perdidas para sempre. Que tristeza! Não posso deixar de sofrer tudo e de oferecer todos os sacrifícios para a sua salvação e para desagravar o meu querido Jesus. Quando, por alguns momentos, me ponho a contemplá-lo, crucificado, e o vejo tão mal tratado, então redobro de pena e o meu coração enche-se de dor e de tristeza ao recordar-me que, a cada momento, Ele é crucificado.

      Sofro muito. Muitas vezes o meu corpo, com tantas dores e já tão enfraquecido, parece não poder resistir mais, parece morrer. Mas, o meu espírito, no meio de tudo isto, vive ainda. Deus seja louvado! Vivo com grande ansiedade em sofrer cada vez mais, para assim consolar e desagravar aquele que tanto amo e morreu por mim.

      E, assim, sem nenhum momento de consolação, eu vou vivendo no meio de trevas e de abandono, mas sempre nos braços de Jesus, a fazer de sentinela nos seus sacrários e em toda a parte onde Ele habita sacramentalmente. Digo-lhe assim:

Ó meu Jesus, se eu me distrair ou adormecer e vierem sobre Vós os crimes do mundo, chamai-me com grande aflição e fortes dores para eu ir em vossa defesa, para não deixar abeirar das vossas prisões de amor os pecados do mundo. Eu quero viver e morrer nos vossos santíssimos braços, mas sempre a consolar-vos, a amar-vos, a fazer-vos companhia e a desagravar-vos.

      Adeus, até não sei quando. Lembranças de minha mãe, da Deolinda e da Sra. Dª Sãozinha. Abençoe, por caridade, esta que não quer ser esquecida junto de Nosso Senhor e que promete também não o esquecer,

      Alexandrina M. Costa

Balasar, 15-1-1936

      Viva Jesus,

      Como está a chegar o dia dezasseis de Janeiro, cumpre-me o dever de felicitar Vª Revª e de lhe oferecer alguma coisa que tenha ao meu alcance. Sou pobrezinha. Bem desejava ter um bom presente para oferecer ao meu pai espiritual no dia do seu aniversário. Mas, já que mais não posso, limito-me a receber o meu querido Jesus, juntando-lhe, também, todos os meus sofrimentos desse dia, para que Nosso Senhor mos aceite por todas as necessidades e intenções de Vª Revª. Não é nada para quem tudo merece!

      Por amor de Jesus, aceite-me os desejos que tenho, de além da comunhão e dos sofrimentos, mais alguma coisa lhe enviar.

      O meu querido Jesus ainda não se deu por satisfeito na minha crucificação. Atende bem aos meus pedidos de me aumentar os meus sofrimentos; além das enormes dores que me torturam, sinto de novo que estou suspensa no ar, como quem anda num bambuão, para baixo e para cima, para um lado e para o outro, o que me causa grande aflição em todo o corpo. Também me tem aumentado muito os sofrimentos no braço esquerdo. Bendito seja Nosso Senhor, faça-se a Sua Santíssima Vontade, que também é a minha. Mas, unindo aos sofrimentos do corpo, os da alma, é que são elas. Só com a força divina é que eu posso resistir. Este abandono completo em que o meu amado Jesus se digna ter-me, custa-me, mas custa-me muito. Não ter um momento de luz nem de consolação espiritual! Mas, nada de temer! Tenho muita confiança no meu amado Jesus, que não me abandonará e hei-de subir vitoriosa até ao alto do calvário. Eu digo muitas vezes:

Ó meu Jesus, o que quero é consolar-Vos muito, muito, ainda que Vós a mim não me deis nem um momento de consolação.

      E Jesus quer fazer-me a vontade.

      O pecador de quem Vª Revª me falou não dá sinais de convertido? Tenho feito e oferecido tantos sacrifícios por ele! Tenho sofrido tantas horas, uma sede abrasadora! Sim, por amor de Nosso Senhor, recordando a sede que Ele sofreu na cruz e a sede que tem de ser amado na Santíssima Eucaristia; mas tudo para a conversão dele. Abençoe, por caridade, esta que humildemente lhe pede perdão,

      Alexandrina

      Muitas lembranças da Deolinda, ela, já que mais não pode, promete, amanhã, comungar e oferecer algumas orações por Vª Revª, festejando assim o aniversário do seu director espiritual a quem ela muito julga dever.

      Muitas lembranças também da minha mãe que também promete comungar por Vª Revª.

Balasar, 20-2-1936

      Viva Jesus

      Tenho pensado muito em escrever a Vª Revª, sobretudo às quintas-feiras, mas como não sabia onde Vª Revª se encontrava, não o tenho feito. Hoje, não pude deixar de satisfazer os meus desejos e aqui estou a ditar duas palavrinhas, embora me custe.

      Pouco depois de Vª Revª se ter retirado, senti uma tristeza tão grande, que nem sei explicar. Só do Céu poderiam ter vindo aqueles momentos de boa disposição para lhe poder falar. Depois, senti-me tão mal, que só por volta das três horas da manhã é que consegui descansar. Com isto estava alegre, porque o meu maior desejo era, e é, nunca dormir, nem de dia, nem de noite, para assim poder acompanhar o meu Jesus Sacramentado.

      Repito-Lhe muitas vezes:

 Ó meu Jesus, eu quero combater com as  armas dos meus sofrimentos, para longe de Vós os crimes do mundo, matá-los por completo, para não virem sobre as vossas prisões de amor renovar a Vossa Santíssima Paixão.

      Quanto maiores são as minhas dores, maior alegria tenho, para assim consolar muito o meu Jesus. Já que não tenho mais nada para Lhe oferecer, ofereço-Lhe as minhas dores, sendo tudo para O amar e O fazer amado. O que eu sofro, não sei explicar, só Nosso Senhor o sabe.

      Continuo no mesmo abandono; consolações para mim, agora não sei o que são. Os pecadores preocupam-me muito e os desejos de amar a Nosso Senhor e não saber como. Por vezes causa-me tanta aflição que me faz lembrar Nosso Senhor no alto da cruz, quando dizia: “Meu Deus, Meu Deus, porque me abandonais”. Às vezes apetece-me gritar alto e dizer: “Meu Jesus, Meu Jesus, eu quero amar-Vos”.

      A Deolinda tem passado pior: Está, por ordem do médico, proibida de fazer qualquer trabalho. Está mesmo em descanso absoluto, passando os dias na cama, ou então umas horas numa cadeira de encosto. Por isso, hoje, tenho uma nova secretária, que é a Sãozinha.

      Peço que nos recomenda ao Sr. Dr. Dias, que não me tenho esquecido dele nas minhas pobres orações.

      Lembranças da minha mãe e da Deolinda.

      A secretária também se recomenda muito e pede o favor de dizer se durante as férias de Carnaval o pode procurar em Braga.

      Lembro a Vª Revª, mais uma vez, a necessidade que tenho de que peça por mim, que eu não faltarei ao que tenho prometido.

      Abençoe, por caridade., esta que humildemente lhe pede perdão.

      Alexandrina Maria da Costa.

Balasar, 5-3-1936

      Viva Jesus

      Recebi a carta de Vª Revª, que muito agradeço.

      O meu maior desejo é que, quando receber esta minha carta, esteja já bom, para poder pregar continuando, assim, o trabalho que nesse colégio tem de fazer. Empenho-me, o mais possível, para que com os meus sofrimentos, orações e boas obras o possa ajudar nessa tarefa de bem fazer às almas.

      Se fosse possível eu sofrer todos os sofrimentos do mundo, contanto que Nosso Senhor fosse amado por todos, eu não me recusaria a isso. Digo isto muitas vezes a Jesus:

 Quem me dera poder consolar-Vos, dizendo-Vos: Vós não sois mais ofendido, nem Vos vão mais almas para o Inferno, Vós sois amado e conhecido por todos.

      Oh, sim! Eu quero sofrer muito para que o vosso sangue não seja derramado inutilmente, por nenhumas almas.

      Ainda continuo a sentir a mesma tristeza. Quando o sol se descobre e quando ouço as avezinhas, sinto uma tristeza tão grande, que até me apetece chorar.

      Isto acontece-me desde há muito; ainda eu não tinha adoecido e muitas vezes, de manhãzinha quando saía para o campo, parava a escutar os passarinhos e em vez de me alegrar, entristecia-me e às vezes ia até às lágrimas. Por isso não me admira que me sinta sempre triste, porque a tristeza em mim subsiste desde pequena.

      A noite de 22 para 23 de Fevereiro passei-a tão mal que pensava ser a última. A temperatura subiu a trinta e nove graus, as dores e os sofrimentos aumentaram e quasi que não dormi. Só pela manhã é que consegui descansar, um pouquinho. No meio deste sofrimento, disse a Jesus:

 Ó meu Jesus, quantos mais sofrimentos, mais actos de amor para os vossos sacrários, maior a prova do meu amor para Convosco. Sim, maior prova de amor, porque os recebo alegre e satisfeita e mais aumenta a minha confiança em Vós, que haveis de me alcançar tudo quanto vos peço para as pessoas que me são tão queridas e para os pecadores.

      No meio de tanto sofrer pronunciei o “Magnificat”, em acção de graças por tanto sofrer.

      Abraçava o meu crucifixo e dizia:

 Crucificai-me, Meu Jesus, a valer. Fazei-me semelhante a Vós; fazei-me participar da Vossa Santa Paixão.

E pedia a Nossa Senhora que O ajudasse a crucificar-me e dizia-lhe também:

 Alerta! Alerta! Estou alerta. Eu sou a sentinela de Jesus Sacramentado. Para longe de Vós os crimes do mundo.

Balasar, 16-3-1936

      Viva Jesus

      Do coração lhe agradeço as boas palavras que tive, que me vieram alegrar muito.

      O dia de sexta-feira passada foi de grande tristeza para mim e para todos os meus, por termos recebido más notícias do Brasil. Só à noitinha, quando recebi a cartão do meu paizinho, é que aliviei a minha dor.

      Cada vez é maior o abandono em que Nosso Senhor se digna ter-me; parece que me quer associar mais à Sua Santíssima Paixão. Recebo Nosso Senhor e fico como quando recebo qualquer visita e não lhe ligo importância nenhuma. Raras vezes, desde que passa algum tempo, é que sinto então grandes desejos de amar muito Nosso Senhor e me causa muito aflição ver a frieza com que O tenho recebido. Faz-me ficar preocupada e triste. Custa-me tanto viver assim! Lembra-me tantas coisas.

      Muitas vezes estou triste e aflita e sem saber por quê. Ontem de manhã, senti uma tristeza tão profunda! Parecia-me ver-me cercada e sobrecarregada não sei de quê. Afigurava-se-me que ouvia dizer: que enorme peso de pecados tens sobre ti e sobretudo a ira, a grande ira, toda a ira de Deus. O que tu tens de pagar! Eu ofereci-me toda a Nosso Senhor. Dizia-lhe:

 Meu Jesus, dou-me toda a Vós para Vos pagar, quanto me seja possível, até ao meu último alento, até que eu dê o meu último suspiro e entregue,  nas vossas divinas mãos, a minha alma para Vos bendizer, louvar e amar por toda a eternidade. Ó meu Jesus sede comigo, não me abandoneis. Eu sou nada, nada, mas confio em Vós.

      Fiquei por bastante tempo muito aflita; eram dúvidas e mais dúvidas. É que eu não sabia, se sim ou não, havia de dizer a Vª Revª; pareceu-me que ouvi dizer-me: a quem queres obedecer? Eu, com as minhas forças quasi gastas, pouco posso rezar, tanto vocalmente como mentalmente. E como hei-de eu resistir a isto! Mas tenho confiança que o meu querido Jesus não me há-de abandonar, assim Lhe digo.

      Quando estou pior, penso que morro sem ter algumas coisas que desejo, como seja, não morrer à quinta-feira e ter Vª Revª, junto de mim. No meio das minhas grandes dores e tribulações, a oração que mais me sorri é o “Magnificat”.

      A Deolinda tem sentido ligeiras melhoras. Não me esquecerei nunca das recomendações de Vª Revª. Minha mãe, a minha irmã e a minha secretária recomendam-se muito e agradecem as lembranças de Vª Revª.

      Por caridade, abençoe esta pobre

      Alexandrina

Balasar, 26-3-1936

      Viva Jesus

      Vou, hoje, escrever para lhe agradecer as boas notícias que recebi e dar-lhe as minhas em duas palavrinhas apenas, pois, hoje e nesta ocasião, custa-me muito a falar.

      Penso que chegará, em breve, o dia para mim há tanto tempo desejado, em que Nosso Senhor se digne vir-me buscar para o Céu.

      Encontro-me tão cansada e tão exausta que nem sei como passo os dias e as noites.

      As dores que eu sinto são tão grandes e tantas, tantas, que só Deus sabe quanto eu sofro. Não há ninguém que saiba avaliar o meu sofrimento. Mas ao contemplar o meu crucifixo e ao ver que Nosso Senhor se deixou crucificar numa cruz por nosso amor, eu infundo-me duma tal confiança que nada temo.

      Tenho a certeza que Nosso Senhor é o Cireneu do meu calvário e me suaviza a minha cruz. Se não fosse o meu amado Jesus, há que tempos eu tinha desfalecido!

      Na quinta-feira, dia da Instituição do Santíssimo Sacramento, logo de manhã, renovei a Nosso Senhor, uma pequenina oferta, já que mais nada tinha para oferecer a Nosso Senhor, como prova do meu amor para com Ele, por ter instituído este tão grande sacramento, o meu grande sacramento.

      Principalmente neste dia é que eu senti, uma tristeza tão profunda, um desapego a tudo e principalmente a este Augusto Sacramento. À noite, depois de receber a carta e de ouvir o que me dizia, recordava com saudade o esquecimento que, involuntariamente, tinha tido para com Jesus Sacramentado. Que tristeza eu tinha de não ter nada para lhe oferecer. Vivo sem consolação nenhuma. Depois de receber Nosso Senhor, faz-me lembrar aqueles pobrezinhos, quando batem à porta dos ricos e pedem uma esmolinha e acabam por desistir, sem sequer ao menos os mandarem embora.

      Comigo dá-se a mesma coisa. Peço e ofereço. uma e outra coisa a Nosso Senhor e, nem sequer, fico mais animada. Seja feita em tudo a Sua Santíssima Vontade.

      A minha irmã passa um bocadinho melhor, mas ainda está em tratamento rigoroso. Agradece e retribui as lembranças que se dignou mandar, assim como a minha mãe e a Sãozinha.

Esta manda pedir se no dia quatro de Abril poderá ser atendida por Vª Revª, mas só depois das dez horas, hora a que chega o comboio. Peço o favor de me recomendar de novo ao Sr. Oliveira Dias. Abençoe, por caridade, esta que, humildemente, lhe pede a bênção e perdão.

      Alexandrina

Balasar, 18-4-1936

      Primeiro que tudo, quero agradecer a Vª Revª as boas palavrinhas que me deu no dia dos meus anos, assim como o santinho. Peço, por especial favor, a caridade de agradecer por mim, o lindo santinho que recebi do Sr. Dr. Oliveira Dias.

      De quinta para sexta-feira santa, por volta das onze horas da noite, ainda eu não tinha conseguido adormecer, porque todos os meus desejos eram de fazer companhia a Nosso Senhor na Sua Santíssima Paixão, pareceu-me ver umas árvores de folhas estreitas e compridas, e a descer por uma pequena encosta, um grupo de vultos que me fez lembrar soldados de armas ao ombro. Ao mesmo tempo ouvia um som parecido com o chocalhar de uma campainha.

      No fim da encosta vi como que uma capelinha muito luminosa e não sei quê mais à frente. Era tão bonito este lugar que me fez lembrar se seria Nosso Senhor e os seus discípulos. Mais tarde afigurou-se-me ver então só Nosso Senhor, já coroado de espinhos. Isto fez-me inquietar bastante, por não saber se havia de mandar dizer ao meu paizinho, ou não. Se o digo fico aflita, se o não digo aflita fico. E para maior aflição, o demónio tem-me atormentado muito e vem-me com estes disparates:

— És tu a maior condenada no inferno. Hás-de aparecer àquele impostor a dizer-lhe que estás condenada pelo que lhe disseste. E que contas aquele malvado há-de dar, por te ter acreditado. Não te ofereças como vítima pelos pecadores, que cada vez mais te condenas. Não rezes, que te não vale de nada. As tuas orações não têm merecimento nenhum. Estás perdida; estás nas minhas mãos; estás nas mãos de Satanás.

      Afigurava-se-me que andavam em volta de mim, numa correria e parecia-me ouvir umas gargalhadas; até parecia que essas gargalhadas eram dadas por mim.

      Durante algum tempo, fiquei como que a ligar muita importância, sem recorrer a Nosso Senhor. Mas, ao cabo de pouco tempo, principiei a beijar as santas chagas de Nosso Senhor e senti logo algum alívio e dizia assim:

 Ó meu Jesus, eu amanso-Vos. sou toda Vossa, sou Vossa vítima. Minha Mãe Santíssima, não consintais que eu ofenda a Jesus, nem na mais leve sombra de pecado.

Mas quase logo principiei a ouvir outra vez:

— Não te vale nada, estás perdida. És minha, posso-me sentar à vontade; já não me foges...

      E outras frases semelhantes a estas. Mas no íntimo do meu coração eu digo a Nosso Senhor:

 Faça-se a Vossa Santíssima Vontade. Dou-me toda a Vós, disponde de mim como Vos aprouver, que eu não quero ofender-Vos.

      Termino pedindo perdão por não ter respondido há mais tempo.

      Abençoe, por caridade, e pela mesma, lhe peço que não se esqueça de mim.

      A bênção e o perdão lhe pede a pobre

      Alexandrina.

      P.S. Peço que me recomende muito ao Sr. Oliveira Dias e que, por caridade, peça por mim que preciso muito.

      Alexandrina.

Balasar, 14-5-1936

      Viva Jesus

      Tem-me custado muito a passar todo este tempo sem umas palavrinhas do meu paizinho, para me darem força e alento, nestes dias que eu tenho vivido. Ai, meu Jesus, como têm sido tão atribulados!

      É bem verdade que custam mais os sofrimentos da alma do que os do corpo. Apesar de eu não sentir nenhumas consolações espirituais, ao recordar-me das santas lições que me tem dado, sinto-me reanimar um pouco. Se eu pudesse tê-lo mais vezes junto de mim, seria mais suave a minha cruz, não me custaria tanto viver. Não vejo nada, tudo se esconde de mim. Por mais que me esforce por fazer tudo bem feito e amar muito a Jesus, cada vez me vejo mais pobrezinha e despida de tudo. Quando peço a Nosso Senhor para ser muito santa, para O amar muito, muito, que abismo de misérias eu vejo em mim e que distância tão grande me separa de Nosso Senhor!

      Não sei se o paizinho se lembra de o ano passado, no dia da Santíssima Trindade, Nosso Senhor me dizer:

 Não assistes a esta festa, mas assistirás a todas as outras por toda a eternidade.

      A minha ideia é, se nesse dia já estarei no céu. Mas, não sei os desígnios de Nosso Senhor.

      O que eu sei dizer é que o demónio continua a desempenhar bem o seu papel: busca todos os meios para me ter desassossegada — como eu me vi aflita com ele no sábado passado! Estou em dizer que ataque dele assim tão forte, nunca tinha tido! Principiou por dizer que tinha chegado o tempo de serem descobertas as minhas mentiras, que se ia saber a verdade, porque eu não ia morrer no tempo indicado.

— Mata-te! Escuta-me! Escolho-te uma morte que nada te custa; se não, que vergonha! Se era comigo!

      E dava umas fortes gargalhadas.

— Queres que te ensine a fazer pecados?

      Até aqui ainda fui resistindo. Mas, depois, muito me custou. Tinha bocados em que não podia tirar os lábios do crucifixo, nem da minha mente me saía a jaculatória "Jesus, Maria, José". Chamou-me um nome e perguntou se eu sabia o que era.

      — Escuta-me que eu ensino-te.

      Eu dizia:

 Meu Deus, meu Deus, não quero pecar. Ó meu Jesus, eu não quero ofender-vos. Minha Mãe, minha querida Mãezinha do céu, não permitais que ofenda a Jesus!

      E, graças a Nosso Senhor e a Nossa Senhora, fiquei sem saber as lições desse maldito. Depois de tudo isto, dizia-me:

Não é ninguém que te diz estas coisas, mas sim a tua malícia.

Eu confessei-me, mas não disse isto. Não fiz pecado, pois não?

      Não digo mais nada, que estou muito cansada. Tenho o meu corpo numa dor só. Lembranças de minha mãe, da Deolinda e da Sra. Dª Sãozinha. Abençoe, por caridade, a pobre,

      Alexandrina.

      P. S. Peço o favor de nos recomendar ao Sr. Dr. Oliveira Dias.

Balasar, 28-5-1936

      Viva Jesus

      Só hoje, venho agradecer-lhe as duas cartinhas que recebi e que me vieram trazer um pouco de alívio à minha pobre alma. Peço perdão por não ter escrito há mais tempo. Muitas vezes me lembrei de o fazer, mas não tinha vontade; não sei se é só devido à falta de forças ou se Nosso Senhor, também me quis tirar estes desejos para em nada sentir consolação.

      Não esqueça junto de Jesus e da querida Mãezinha do Céu, esta filha espiritual, que vive em tamanho abandono, que só, por milagre dos seus dois queridos amores, posso resistir sem desfalecer de todo, e não ter deixado de fazer as suas poucas orações. Meu Jesus, que desconsolação tão grande! Parece-me estar como quem quer subir a uma árvore e, a certa altura, sem forças cai abaixo e desanimado de todo, contempla aquela altura que julga impossível de subir. É assim o meu viver; pobre de mim. Mas não digo bem. Se o meu querido Jesus me der forças para subir até ao fim do calvário, sou rica, muito rica. Quando chegará esse dia bendito, em que eu possa dizer:

 Ó meu amado Jesus, está ganha a batalha, já nunca mais volto a ofender-Vos; agora é só amar-Vos, sem limites por toda a eternidade.

      O que às vezes me dá algum contentamento, no meio das enormes dores que constantemente me torturam o corpo e a alma, é a chuva de balas de amor que a cada momento atiro para o Céu e para os sacrários. Misturo aos sofrimentos algumas orações e cânticos em honra de Jesus Sacramentado e da querida Mãezinha do Céu. Tenho cantado muito durante este mês; quase sem me alimentar não sei de onde me vêm forças para tanto. Quanto mais agudo é o sofrimento, mais me apetece cantar, ou então ter constantemente na memória aquela jaculatória que vinha no lindo santinho que me enviou. Viva Jesus! Viva Maria! Mesmo a cantar, imploro de Nosso Senhor e da Mãezinha do Céu bênçãos e graças para os pecadores.

      Quando a tristeza e as aflições se apoderam de mim, eu lembro-me das palavras do meu paizinho que não quer que eu me aflija, nem Nosso Senhor o quer também; retomo o ânimo e fico melhor.

      A Senhora Dª Sãozinha, manda perguntar se pode ir aí e ser atendida no dia quatro de Junho. Ela recomenda-se muito a Vª Revª, bem como a minha mãe e a minha irmã.

      Por caridade, abençoe a pobre

      Alexandrina.

Balasar, 15-6-1936

      Viva Jesus

      Senhor P. Pinho

      Resolvi escrever-lhe duas palavrinhas para V. Revª saber como tem passado a minha querida irmãzinha.

      Durante a semana passou melhor um pouquinho em relação à noite do dia em que V. Revª aqui esteve. No sábado, durante o dia, já me pareceu que ela estava outra vez pior. À noite deu-lhe uma aflição tão grande que me pareceu que ela morria. Também lhe têm dado aquelas tremuras, como quando V. Revª aqui esteve. Agora continua muito, muito doentinha; fala pouco e com muita dificuldade. Quanto às aflições de alma, sempre sossegou mais um bocadinho — bem preciso era, pois assim não podia viver, era impossível.

      Eu, ao presenciar tudo isto, exclamava:

 Ó meu Jesus, como havemos de viver assim?

      Apesar de estar melhor, os assaltos do demónio ainda continuam a ver se lhe tiram a paz. Agora não fala só de V. Revª, e diz-lhe assim:

— Eles não fazem caso de ti; dizem isso para te enganar; estás cercada por nós. Pertences-nos; nunca mais te salvas.

      Outros dias diz-me assim:

 Sinto tantos, tantos desejos de ir para o céu! Ver para sempre face a face o meu querido Jesus, a minha querida Mãezinha do céu e toda a Santíssima Trindade! Parece-me não poder suportar por mais tempo estes desejos.

      Diz-me também, que em outras ocasiões é tal o abandono em que se encontra, que nada sente desses desejos e tudo desaparece. Também me pergunta assim:

 O meu paizinho estará zangado comigo? Fui tão marota para ele! Tenho-lhe desobedecido.

      Senhor P. Pinho, em nome da Alexandrina, agradeço-lhe a grande caridade que teve em conseguir que aqui viesse o Sr. Dr. Oliveira Dias. Ela diz que bem gostava de lhes pagar, mas já que não pode, que Nosso Senhor se encarregará de lhes pagar por ela. Também pede para que nos recomende muito.

      Adeus, por hoje. Por caridade, não se esqueça de pedir por nós, que muito, muito precisamos. Lembranças de minha mãe, da Dª Sãozinha e a Alexandrina pede que lhe envie daí uma grande bênção.

      Por caridade, abençoe esta que muito precisa,

      Deolinda Maria da Costa.

      P. S. A Sra. Dª Sãozinha manda perguntar se poderá ser atendida no dia vinte ou no dia vinte e um do corrente e a que horas, visto que o comboio, no dia vinte, ainda chega aí cedo.

      Mais uma vez pede a bênção a pobre,

      Deolinda

Balasar, 25-6-1936

      Viva Jesus

      Senhor P. Pinho

      Resolvi escrever-lhe de novo, para contar a V. Revª como tem passado a Alexandrina. Pensava que V. Revª, a estas horas, já saberia alguma coisa pela Dª Sãozinha, que tencionava ir a Braga no dia vinte e um. Mas, como o tempo não permitiu, ela não foi e eis a razão porque resolvi escrever esta carta a contar o pouco que sei da Alexandrina.

      Ela continua a passar muito mal, constantemente com aquelas tremuras, que lhe dão principalmente de dia. Às vezes aflige-se tanto que passa bocados de tempo sem poder falar nada, só por sinais é que sabemos o que ela quer.

      No Domingo à tarde, deram-lhe tremuras tão fortes e por tanto tempo, ela estava tão doente, tão doente, que dizia assim:

Agora é bem verdade que me parece que não posso mais.

      Mas, dali a bocadinho, ouvi-a dizer baixinho:

Ó meu Jesus, perdoai-me os meus queixumes. Com o vosso auxílio prometo não os tornar a fazer.

      As aflições da alma continuam. A Alexandrina diz que é tão pobrezinha que não tem nada, que está de mãos vazias para aparecer diante de Nosso Senhor. Dantes parecia-lhe que tudo o que fazia e rezava logo desaparecia e que ela ficava sem nada. Agora diz que ao pensar em fazer as coisas, mesmo sem ainda as ter feito, que já tudo tem desaparecido.

      Os assaltos do demónio continuam furiosos. Há dias pareceu senti-lo de um lado para o outro dela e dando risadas muito finas dizia-lhe:

— Isto é que me consola e é que eu acho lindo. Contigo já não preciso de me afligir: estás por minha conta. Estás abandonada por Deus e pelos teus dirigentes, os quais já quasi se não importam de ti. São uns impostores. Não fizeram melhor cena do que tu por te acreditarem. Eu, é que te falava verdade. Sou a verdade que se não engana. Eles andam a dizer os teus pecados, a fazer pouco de ti.

      E outras coisas semelhantes a estas.

      Adeus, até não sei quando. Não sei quando poderei voltar a escrever. Há vinte e quatro horas que principiei esta carta e vi riscos de a não acabar a tempo de ir hoje no correio. A Alexandrina pede que a abençoe e que, por caridade, peça muito a Jesus por ela. Muitas lembranças de minha mãe e da Dª Sãozinha.

      Por caridade, abençoe-me e não esqueça junto de Jesus a pobre

      Deolinda

Balasar, 10-9-1936

      Viva Jesus

      Como tem passado?

      Eu, sempre muito doentinha.

      O Sr. Abade está na Póvoa, por isso hoje não comunguei. Mas, como os meus desejos são só de viver com Jesus Sacramentado, ia passando a manhã em comunhões espirituais e a fazer, em espírito, companhia a Jesus Sacramentado em todos os sacrários do mundo. Oferecia-me toda a Ele e fazia-lhe os meus pedidos. Mas, com isto, não sentia consolação nenhuma, porque tenho passado todos estes dias em grande desolação espiritual. Ouvi que Nosso Senhor me chamava, "Minha filha", mas como não tinha comungado não atendi logo. De novo ouvi:

— Filha, minha filhinha! Não é preciso comungares para Eu te falar. A cada momento posso falar-te, porque estou sempre contigo. Escuta-me, sou o teu Jesus. Experimenta bem o meu amor. Essa paz que sentes em ti, só Eu ta posso dar.

      E era certo. Como eu me sentia bem! Tudo tinha desaparecido. E continuou o meu querido Jesus:

— Vou dizer-te os meus desejos. Minha filhinha, manda dizer já ao teu pai espiritual, que espalhe já, que faça ir aos confins do mundo, que este flagelo é um castigo, é a ira de Deus. Eu castigo para os chamar. A todos quero salvar. Morri por todos. Eu não quero ser ofendido e sou-o tão horrorosamente em Espanha e em todo o mundo. Que crueldade! Corre tanto o perigo de se espalharem estas barbaridades!

Eu vou dizer-te como vai ser feita a consagração do mundo à Mãe dos homens e minha Mão Santíssima. Amo-o tanto! Será em Roma, pelo Santo Padre, consagrado a Ela o mundo inteiro e, depois, pelos padres em todas as igrejas do mundo, sob o título de Rainha do Céu e da terra, Senhora da Vitória. Se o mundo corrompido se converter e arrepiar caminho, Ela reinará e a Vitória, por Ela, será ganha.

      Senti, então, aquela força interior e calor, de que há muito falei ao paizinho. E dizia-me Nosso Senhor:

      — Vai, minha filha, não haja receios que os meus desejos serão cumpridos.

      Das coisas que eu disse ao paizinho, no dia da minha missa, tinha mais estas palavras: o perigo iminente.

      Muitas lembranças de minha mão e da Deolinda. Por caridade, não me esqueça diante de Jesus, que muito preciso. Já fico tão aflita! Abençoe, por caridade, a pobre,

      Alexandrina.

Balasar, 26-9-1936

      Viva Jesus

      Apenas umas palavrinhas para saber como tenho passado e para saber que ainda vivo. Não sei por onde anda, mas escrevo para Braga, porque mais dia menos dia, sempre lhe será entregue. Recebeu uma carta que escrevi para o Porto? Penso tantas vezes se ela não lhe teria sido entregue. Nosso Senhor continua a estar muito escondidinho. De vez em quando, lá vem Ele aumentando o peso da minha cruz. Não tenho comungado sacramentalmente. Ai, Jesus, que saudades! Como é difícil viver assim. Todos os dias me preparo como para o receber sacramentalmente. Faço a comunhão espiritual, repetindo-as um grande número de vezes durante o dia. Dou-lhe graças, dou-me toda a Ele, faço-lhe todos os meus pedidos, mas, ó meu Deus, no meio de trevas, secura e aridez, enfim, num abandono total.

      Só no domingo passado, depois de ter recebido Nosso Senhor, senti em mim um regozijo tamanho, queria fazer tanta festa a Nosso Senhor, mas parecia-me que nada lhe dizia, nem sabia dizer-lhe. E eis-me outra vez, no mesmo abatimento. Juntando a tudo isto, a falta de noticias do meu paizinho e outras várias aflições, ó meu querido Jesus, que muito tenho para Vos oferecer.

Mas, os desejos que eu tenho de consolar Nosso Senhor, dão-me forças para tudo sofrer. Eu não me aflijo nem tenho pena do meu tão grande sofrimento. Mas, aflige-me e tenho pena, muita pena do muito que Nosso Senhor é ofendido. Se eu possuísse todos os corpos do mundo, todos ofereceria a Nosso Senhor para o martírio, para assim O poder desagravar de tantos crimes. Mas, dou-lhe, ao menos, o que tenho, tudo quanto Ele me dá.

      Os sofrimentos do corpo também têm aumentado, principalmente, quando me dão as tremuras, que me custam muito mais a sofrer do que dantes. Estive com a gripe, mas dessa, agora estou melhor.

      Adeus, por hoje, que não posso mais.

      Muitas lembranças de minha mãe e da Deolinda. Por caridade, abençoe-me e não se esqueça de pedir muito por mim a Jesus.

      Alexandrina.

      P. S. Peço o favor de nos recomendar muito ao Sr. Dr. Oliveira Dias.

Balasar, 16-10-1936

      Viva Jesus

      É já noite. Está para chegar o correio e eu, pobre de mim, sem nenhum conforto para me ajudar a passar estes dias tão dolorosos que Nosso Senhor se tem dignado apresentar-me, para eu, sem nenhum auxílio, sofrer tudo quanto me envia.

      Resolvi dizer-lhe duas palavrinhas. Vai em sete semanas que não sei nada do meu paizinho. Não sei que mistério é este: será doença? Será excesso de trabalho? Ou está queixoso comigo? Não sei. O que sei, é que me tem custado imensamente viver assim, abandonada de tudo.

      Como Nosso Senhor é bom! Dá-me tudo para eu sofrer mais. Se nuns momentos me deixa ir quase até ao desânimo, mostrando-me a minha miséria e a minha pobreza, vendo-me despojada de tudo, noutros momentos, desapercebidamente, o meu querido Jesus, é Ele, só Ele, posso dizê-lo, porque só com Ele é que tenho forças para sofrer tudo; lá vem o meu querido esposo, com as suas divinas mãos, levantar-me da minha queda, dando-me força e ânimo para seguir. Eu, então, digo-lhe muitas vezes:

 Faça-se a Vossa Santíssima vontade em tudo, meu bom Jesus, O que eu quero é amar-Vos e desagravar-Vos de tantos crimes. Mais, meu Jesus, mais. Tudo para Vós, meu Jesus, para Vos consolar.

      Vou terminar, pois já não consigo falar mais nada. Por amor da Mãezinha do Céu e de Jesus Sacramentado e das almas do purgatório, lhe peço que me escreva umas palavrinhas.

      Muitas lembranças de minha mãe, da Deolinda e da Sra. Dª Sãozinha.

      Abençoe, por caridade, a pobre

      Alexandrina.

      P. S. Peço o favor de nos recomendar ao Sr. Dr. Oliveira Dias.

Balasar, 3-11-1936

      Viva Jesus

      Meu querido paizinho espiritual.

      Como tem passado de saúde, bem ou mal? Eu, sempre num mar de dores, mas muito alegre com tais sofrimentos. Sabe o que eu digo a Nosso Senhor? Quero que as minhas dores sejam peças e metralhadoras de amor a caírem constantemente sobre os sacrários.

      Quanto aos sofrimentos da alma, eles são muitos, muitos. Só peço a Nosso Senhor que me não abandone. E confio que não, apesar de eu ser a mesma marota e muito marota.

      Muito obrigada pela boa cartinha que teve a caridade de me escrever, assim como pelas novenazinhas de Nossa Senhora, que vinham juntas.

      Meu bom paizinho, no dia vinte e seis, depois da Sagrada Comunhão, estive muito aflita, com falta de ar; mas, passados alguns minutos, de repente, fiquei bem. Eu não sei explicar bem como foi: principiei a sentir um forte calor, mais sobre o lado esquerdo. Não sei o que me iluminava, que ainda não ouvia nada e já sabia o que Nosso Senhor me ia dizer. E logo me falou:

— Minha filha, ó toda minha, ouve a minha voz, a minha divina voz. Tem confiança em mim. Eu tenho-te assim, não te falo mais, porque com essa cruz muito me amas, muito me desagravas. Eu podia falar-te e dar-te consolações a cada momento, sem prejuízo para ti; mas o teu Jesus! Como me desagravar de tantos pecados tão enormes e como me salvar almas? Como lhe tens acudido! Não buscas tu a minha consolação e não a tua?

Minha filha, vou dar-te a certeza da consagração do mundo à tua querida Mãezinha. Diz ao teu pai espiritual para ele mandar dizer ao Santo Padre que quero que seja colocado ao pescoço de uma imagem da minha Mãe Santíssima, um coração e uma chave de prata ou ouro, coisa fina, o que significa que, assim como mandei fechar tudo na arca de Noé, antes do dilúvio, assim quero fechar o mundo inteiro naquela Arca Santíssima. E quero que, depois, tudo o mais que te tenho mandado, seja feito, e que ele tem em conta. A consagração das criancinhas já se tem feito. Se soubésseis como tenho sido desagravado com as comunhões daquelas almas inocentes e dos fiéis mais fervorosos! Como tenho sido desagravado de tão horrendos crimes!

      Sentia um calor abrasador e uma força interior que parecia que me punha num bolo. E dizia-me Nosso Senhor:

— Amo-te tanto, mas ainda bem que correspondes ao meu amor. Vai, filhinha, vai continuar a tua acção de graças.

      Adeus e abençoe a pobre,

      Alexandrina.

Balasar, 21-11-1936

      Viva Jesus

      Sentia em mim grandes desejos de não passar mais tempo sem lhe ditar umas palavrinhas, mas faltam-me as forças. Estou tão fraca! Tenho passado os dias tão doentinha! É bem verdade que vivo porque Nosso Senhor o quer, de contrário era impossível resistir a tanto sofrer. Bendito seja o meu querido Jesus, que me deu a maior riqueza que se podia dar, já nesta vida: deu-me os sofrimentos, deu-me a maior felicidade. Para mim, penso que não é nada uma eternidade inteira para O amar, louvar e Lhe agradecer tantas graças, tantos benefícios e tantas riquezas que ele tem acumulado em mim.

      Olhe, meu bom paizinho, digo isto de todo o meu coração, se agora me viessem dizer que o resto do tempo que tenho para viver o passava sem mais sofrimentos e que tinha a mesma glória no céu, como se continuasse a sofrer, eu responderia que não, mil vezes não. Foi pelo sofrimento que me foram abertas as portas do céu. Eu, ter a dita de me assemelhar ao meu querido Jesus crucificado e desprezá-la? Isso não. Sofrer e sofrer sempre. Amor com amor se paga. Foi por meu amor que Jesus sofreu e morreu e só por amor quero eu, também, sofrer e morrer.

      Eu tenho vivido num contínuo abandono espiritual. Estou à prova, mas seja, em tudo, feita a vontade de Nosso Senhor.

      Vou terminar que não posso mais.

      Muitas lembranças da minha mãe, da Deolinda e da Sãozinha. Não se esqueça, por caridade, de pedir muito por mim a Jesus, que muito, muito preciso.

      Por caridade, abençoe a pobre,

      Alexandrina

      P. S. Peço o favor de nos recomendar muito ao Sr. Dr. Oliveira Dias.

Balasar, 3-12-1936

      Viva Jesus

      Só hoje venho agradecer a boa cartinha que já há dias recebi. Fazem sempre bem à pobre da minha alma as santas lições que nelas me ensina. Alegria ou consolação espiritual não sinto ao recebê-las. Mas, se é assim a vontade do meu querido Jesus, é também a minha. Custe o que custar, não quero nada contra a sua santíssima vontade. Custa-me muito viver assim e compreendo bem que é a força de Nosso Senhor que me reanima e me dá coragem para tudo suportar pelo seu divino amor. Ao contemplar Nosso Senhor crucificado, ao recordar quanto ele sofreu por mim, não lhe posso recusar nada. Só lhe repito e quero repetir sempre, mais, meu Jesus, mais. E Nosso Senhor aceita; tem sempre que repartir comigo.

      É tal a desolação e a frieza em que me encontro, que me faz lembrar como quando pega um fogo numa casa, queima tudo e só ficam as ruínas. Pobre de mim, é o que eu encontro. Uma vida de pecados e de desgostos para Nosso Senhor; nada mais tenho. O meu bom Jesus tomou conta de tudo. Muitas vezes, depois de comungar, apodera-se de mim uma tal tristeza — parece que me esmaga o coração; enfim, só com Jesus posso resistir.

      O demónio não falta com os disparates dele para mais me consumir.

      A respeito de vir visitar-me, ansiosa por isso, estou eu. Viverei ainda nessa ocasião? Não sei. Ó meu Jesus, como estou tão doente! Eu não queria partir para a eternidade sem estar com V. Revª. Peço-lhe a caridade de me mandar dizer se lhe convém vir aqui na vinda para Terroso ou na volta para Braga.

      Lembranças da minha mãe e da Deolinda. Por caridade, não esqueça as nossas necessidades diante de Nosso Senhor e abençoe a pobre

      Alexandrina

      P. S. Por favor recomende-me ao Sr. Dr. Oliveira Dias.

* * *

... contra mim cometiam e não os condenei. Minha filha, tu não te tens enganado nem te enganas; confia no teu Jesus, no teu esposo, no esposo das almas virgens. Deixei isto para te dizer no dia da Imaculada Conceição, da tua e minha Mãe Santíssima, que Ela e Eu muito estimamos.

      No dia dez, quando eu chamava por Nosso Senhor, Ele dizia-me:

— Ai, minha filha, como Eu te amo! Amo-te porque me amas. Amo-te porque me dás almas. Se soubesses o preço de uma alma! E tens-me dado tantas! Amo-te porque és digna do meu amor. És digna do amor de um Deus que te criou e te olhou sempre com predilecção.

      Não posso explicar-me mais, mas também não sei.

      Estimo que passe umas santas e alegres festas de Natal. Por caridade, fale muito de mim ao Menino Jesus. Que Ele esteja comigo até ao fim. Que seja a minha força que eu, por mim só, não posso nada. Sou a criatura mais miserável mais pobrezinha.

      Lembranças da minha mãe, da Deolinda e da Sãozinha. Por caridade, abençoe a pobre,

      Alexandrina

      P. S. Fará o favor de me recomendar ao Sr. Dr. Oliveira Dias e de lhe dar as Boas-Festas por mim.

   

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