Alexandrina Maria da Costa

SENTIMENTOS DA ALMA

MAIO 1953

1º de Maio de 1953 – Sexta-feira

Sinto-me enjoada, cheia, tão cheia, enfartada do mundo. Tenho uns olhares que não são meus, que não podem vê-lo assim tão manchado. Ao mesmo tempo sinto-me de tal forma atraída que quero possuí-lo todo, abraçá-lo, metê-lo dentro do meu coração. O que eu sofro, o que eu sofro, meu Deus, só Vós o sabeis e sabeis compreender. As almas  vêm aos bandos junto de mim. Eu por vezes não posso com tão grande humilhação. Quando olho para mim, para a minha miséria, sinto-me envergonhada. Pobres almas, pobres almas, mas muito mais pobre de mim! Se elas vissem a minha pequenez, o meu nada e a grandiosidade das minhas maldades, fugiam espavoridas. Que vergonha, que vergonha, que tormento este para mim. A natureza está cansada, não pode mais, mas eu tenho, apesar de tanta repugnância, a necessidade de lhes falar de Jesus, de lhes dizer muitas coisas. Sinto-me forçada a metê-las no Coração divino do Senhor. Não sou capaz de dizer o que se passa em mim, o que é este martírio da alma. Amo as almas loucamente, vejo em todas Jesus, isto é, o Seu Sangue divino derramado. Quero fazer tudo para as salvar, quero sofrer até ao fim do mundo, se assim aprouver ao Senhor, para que nenhuma se perca, e não faço nada. Tudo temo, tudo me apavora. Quero dar-me e quero fugir-lhes; quero falar-lhes de Jesus, do amor que Ele nos tem, o que é uma ofensa feita a Ele, e quero-me sozinha, quero calar-me, quero esconder-me. Sinto que a minha é inútil, porque a inutilidade se apoderou de mim e tudo me roubou. Não posso mais. Em que tormento está o meu corpo e a minha alma!

O meu horto foi silencioso, foi de agonia mortal. Todos os pés humanos me calcaram, fiquei da mesma massa da terra. Era humana e divina. O que era divino era a verdadeira vida. Depois do suor de sangue fui com Jesus para a prisão; sofri e amei com Ele. O meu coração da prisão voava às prisões dos sacrários. Inseparável união! O Calvário de hoje foi tremendo, tremendo, cheio de agonia. Eu ia arrastada, não caminhava por mim, não queria saber de viver com Jesus. Mas foi calvário de segredos, de mistérios. Eram mistérios e segredos divinos. Soube senti-los e compreendê-los o coração, mas não sabem os lábios exprimi-los. Eram segredos, mistérios de redenção. No tempo da agonia, mesmo quando bradava ao Eterno Pai, a manifestação destes segredos era mais intensa e profunda. Mais sentia a vida divina a comunicar-se à terra. Jesus expirou e no mesmo momento o segredo da morte reinou no calvário e na minha alma. Jesus apressou-se a ressuscitar e fazer-me ressuscitar. Pouco depois falou-me assim:

— “Jesus está aqui. Desceu do Céu com todo o seu amor e todo o seu poder. Compenetrai-vos, compenetrai-vos da Sua presença. Jesus está aqui. Desceu do Céu por amor. Quer entrar nos vossos corações, quer entrar. Quero reinar, quero reinar, quero ser amado neste reinado. Faz, minha filha, esposa minha, que Eu seja o Rei, que Eu seja o amor de todos os que se abeiram de ti. Estás neste calvário, coloquei-te neste calvário para bem, para seres útil a toda a humanidade. Minha filha, minha filha, faz conhecer às almas quanto Eu as amo. Tu és o porta-voz de Jesus. Tenho-o dito muitas vezes. Falo no teu coração e pelos teus lábios. É por ti, é por ti que Eu falo ao mundo. É por ti que Eu distribuo as minas graças, os meus tesouros, o meu amor. És o cofre, minha filha, és o cofre de todas as riquezas celestes. O teu alimento é o meu Corpo e Sangue, é a minha vida divina. Quem se aproxima de ti, de Mim se enriquece. Pede às almas, pede ao mundo amor, amor para Jesus. Pede às almas, pede ao mundo pureza de vida, enlevo, enlevo, grande união comigo.”

— Ó Jesus, sinto-me tão grande, tão grande! Parece-me que estou no Céu. Parece que deixei o mundo, que tanto anseio deixar. Anseio, Jesus, por ir para Vós e anseio por sofrer por Vós. Sofro por Vós, sim, por Vosso amor, mas para Vos dar as almas. Como sou grande! Como sou grande na Vossa grandeza! Só Vós me compreendeis, Jesus. Quero ir e quero ficar. Quero o Céu porque fora de Vós não sou nada. Quero a terra, porque não posso viver sem dor nem sei viver sem dor, meu Jesus. Quero a dor até ao fim do mundo, se Vós assim o quiserdes. Amo as almas, porque Vos amo a Vós. Quero a dor, porque quero salvá-las.

— “Não aceito, filhinha, não aceito o teu sacrifício. O teu Céu aproxima-se, mas Eu prometo-te e não falto. Como recompensa da tua generosidade, hás-de do Céu salvar tantas almas como se sofresses ater ao fim do mundo.”

— Obrigada, Jesus, o meu eterno obrigada. Não sei neste momento o que é a dor! Que alegria na minha alma!

— “Coragem, coragem, esposa minha. Tudo isto te fortalece para a cruz, para o martírio. Velo por ti, repito mais uma vez: tu hás-de do Céu salvar tantas almas como se   o teu martírio se prolongasse até ao fim dos séculos. Hás-de acudir a muitos males, a todos os males, mas as almas, as almas!...”

— Já compreendo, Jesus, para essas cairá sempre, sempre, a chuva da Vossa misericórdia.

— “Está tudo dito, minha filha. Compreendeste bem. Tu és a heroína vitoriosa, a heroína triunfadora: triunfarás na terra, hás-de triunfar no Céu. Concedo todo o poder para as salvares. Nunca será em vão, nunca serão em vão uma prece dirigida a ti em favor das almas, quando estiveres no Céu.”

— Ó Jesus, já estou sob o peso da dor, das humilhações, já estou em trevas. Sinto-me humilhada com as Vossas promessas divinas. Nada Vos mereço, mas não quero duvidar. ConVosco serei tudo.

— “Vem, vem receber a gota do meu divino Sangue. Os nossos corações uniram-se. Ficaram duas vidas na mesma vida. A gotinha do Sangue passou. Novo sangue corre nas tuas veias. Nova vida te faz viver. Nova vida te faz crescer para Mim, para o Céu.”

— Obrigada, Jesus. A gotinha do Vosso Sangue divino deu-me vida, deu-me luz e de novo a agonia da alma desapareceu. Como sois grande, Jesus! Como sois bom! Bendito sejais! Não esqueçais as minhas intenções. Conhecei-las todas. Não esqueçais a humanidade inteira. Perdoai-lhe. Salvai-a.

— “Fica na cruz, minha filha, fica na cruz. Dá-me dor, sempre dor. Dá-me amor, amor, amor, sempre amor. Dá as almas. Salva-as, salva-as. Conquista-as para Mim. Convence-te. É essa a ansiedade da tua alma. Sou Eu, Eu, Jesus que tudo ponho e opero em ti.”

— Obrigada, obrigada, Jesus. O meu eterno obrigada, meu Amor.

2 de Maio de 1953 – Primeiro Sábado

Esperei a vinda de Jesus ao meu coração, mas esperei-a no maior tormento do corpo e no maior pavor da alma. Queria Jesus, mas não queria o colóquio. Não quero por temor de me enganar. É sempre o grande temor da minha vida. Jesus veio, entrou no meu coração, entrou com tanta doçura, luz e amor que me deixou em paz celeste e como que adormecida, mas ouvia a Sua voz divina a dizer-me assim:

— “Aqui está Jesus, minha filha, que faz do teu coração um paraíso na terra. Dorme, dorme o sono dos anjos mergulhada na vida e no amor de Cristo. Todo o teu ser está mergulhado em Mim. É este o sono e a vida dos eleitos do Senhor. Dorme, dorme na minha paz, no meu amor, na minha paz, no meu amor.”

— Ó Jesus, ó Jesus, logo que Vos recebi, senti-me como que adormecida, mas num sono de luz, num sono de amor. Bendito e louvado sejais por tudo.

— “Filhinha, filhinha, jardim formoso, jardim florido. Cuido mais, muito mais de ti do que o jardineiro cuida dos seus canteiros, por mais zeloso que ele seja. Quero amparar-te. Quero amparar-te, tenho que amparar-te, tenho que velar por ti. Sofre, sofre, dá-me a tua dor urgente e necessária ao mundo. Os pecadores, os pecadores correm, correm para o abismo da perda eterna. Trá-los, trá-los todos para Mim por meio, por intermédio da minha Bendita Mãe. Avante, avante, sempre avante na mais espinhosa, mas na mais nobilíssima missão. Diz ao teu paizinho, minha filha, àquele que escolhi, sim, fui Eu que o conduzi junto de ti para guia e luz da tua alma. Diz-lhe que o Jesus do teu coração, que o Jesus dos seus amores conta com ele. Dele tudo espera. Ele é mestre das almas eleitas. Ele é iluminado, tudo iluminado do divino Espírito Santo. Diz-lhe que ele não errou nem erra. Jesus está com ele. Diz-lhe que lhe tenho o amor mais predilecto e não falto, não falto ao que prometi. O sol rompeu as nuvens. Já brilha com a maior luz e intensidade. Amo-o, amo-o! Todo o Céu o ama! Diz ao teu médico que Eu servi o sol e a chuva do seu jardim. Ele todo é cuidado pelo Céu. Diz-lhe que ele foi criado para grandes coisas. A missão que ele desempenha foi uma prova de predilecção do amor de Jesus. Escolhi-o porque muito o amo. Escolhi-o, e ele foi-me fiel. Diz-lhe que Jesus lhe pede coragem, coragem. A honra, a glória é de Deus. O bem é para as almas. Dá-lhe amor, amor eterno.

Vem, minha bendita Mãe, conforta, conforta a nossa filhinha. Temos que ampará-la, cuidar dela.”

— “Minha filha, minha filha, estás nos braços da tua Mãezinha, o Coração Imaculado de Maria. Coragem, minha filha, coragem! Incute nos corações e nas almas dos que se abeiram de ti o amor ao Coração de Jesus, o amor ao meu Coração Imaculado. Jesus tem sede. Eu tenho sede, sede de amor, sede de reparação. Queremos ser amados, queremos ser reparados.”

— Mãezinha, Mãezinha, quero dizer tudo, quero fazer tudo, quero sofrer tudo. E não digo, não faço nem sofro nada. Não sou eu a dizer, não sou eu a fazer, não sou eu a sofrer. Compadecei-Vos, Mãezinha. Pedi a Jesus compaixão para o pavor que me causa a minha vida. Como é terno o Vosso abraço! Como são doces as Vossas carícias! Agora, sim, sinto que Vos amo e amo a Jesus. Sinto que Vos abracei com todo o afecto e amor do meu coração. Prometo com a Vossa graça atender aos Vossos pedidos, Mãezinha.

— “Minha filha, predilecta filha de Jesus, filha predilecta de Maria. Tu alegras os Nossos divinos Corações. Trabalha, trabalha; repara, repara. Não descanses, não descanses. Imola-te, imola-te. Dá o teu sangue, dá o teu sangue neste leito de dor, neste calvário, nesta cruz dolorosa que te escolhi. Leva o amor do Coração Divino de Jesus, Coração angustiado. Leva o amor do Coração Imaculado de Maria, Imaculado e Doloroso. Distribui aos que amas, aos que se aproximam de ti. Fá-lo, fá-lo correr mundo, como vento que gira, como sopro que se espalha. Recebe de novo as carícias de Jesus e da Mãezinha. Vai dar-Nos sempre a reparação que acabamos de pedir. Coragem, coragem! Pede ao mundo vida pura, sempre pura. Ai dela, ai dela, se não atende ao brado de Jesus, aos pedidos de Jesus pelos lábios da sua vítima.”

— Obrigada, Jesus, obrigada, meu Amor. Obrigada, Mãezinha, obrigada, Mãezinha, obrigada, minha querida Mãezinha. Peço-Vos perdão para a humanidade inteira e não deixo de lembrar-Vos as minhas intenções. Não as esqueçais, Jesus, não as esqueçais, Mãezinha! Obrigada, Mãezinha!

8 de Maio de 1953 – Sexta-feira

A minha cruz é pesadíssima para eu levar. Ela aumenta de dia para dia. Só vivo da confiança que Jesus a leva por mim. Mas muitas vezes desfaleço, sinto que não tenho confiança, não tenho esperança, não tenho nada. Não sou nada, mesmo nada, nem ao menos vermezinho da terra chego a ser e sou ao mesmo tempo trapo imundo, trapo a desfazer-se de podridão, onde toda a humanidade calca e se limpa ao mesmo tempo. Limpa-se e suja-se, contamina-se com o veneno da minha podridão. Ai, o que eu sou, meu Deus, o que eu sou de miséria e crime, ai, o que vejo dentro em mim! Parece que não posso consentir que as almas se abeirem de mim. De momento para momento aumenta o pavor pela miséria que sinto, pela criminosa que sou. Apavoro-me por sentir que elas outra coisa não podem ver em mim. Tenho medo de as escandalizar, tenho medo que elas com a visão de tantos crimes se percam. A estes sentimentos dolorosos juntam-se outros não menos dolorosos. Enlouqueço-me por elas, quero abraçá-las de tal forma a metê-las todas no Coração Divino de Jesus, a fechá-las todas no Céu. Que indizíveis sofrimentos, que sofrimentos e ânsias infinitas. Parece que é Jesus a arrancar-me o coração deste corpo imundo para o levar para Ele e com ele todos corações do mundo inteiro. Sinto, sinto que Jesus os quer e eu não posso dar-Lhos, nem aguentar com as ânsias que Ele tem de os possuir. Não sei dizer mais nada. Sinto coisas tão grandes como o Céu; sinto a necessidade de falar delas e não sei. Meu Deus, meu Deus, que poder supremo me arranca e atrai para Vós! Que loucura, que loucura a do Vosso amor! Queria falar dele e não me deixa a minha ignorância. Passei a vida esquecida do Senhor. São esses os meus sentimentos, foi assim o meu dia de ontem depois de talvez milhares de vezes pronunciar o Seu santo Nome, fiquei sem nada dizer e nada fazer por Ele.

Esquecida d’Ele e da Sua santa paixão, ou melhor, não esquecida mas mergulhada neste sofrimento de esquecimento, fiquei no solo duro e triste do Horto. Foi tristeza e agonia mortal. Apavorada a minha alma, a lutar com todo o martírio, senti como se um canal descesse do Céu e dentro dele me introduzisse. Aquele canal tinha a vida divina. E toda a minha vida terrena, todo o meu ser de misérias foi por ela trespassada como raios de sol doirados e penetrantes. Que mistura, que mistura… a terra com o Céu! Se eu soubesse exprimir-me com soube sentir, levava uma vida inteira só a falar disto, sem acabar. Acompanhei Jesus na prisão. Durante a noite, repetidas vezes lá nos encontrámos, assim como no sacrário. Hoje de manhã segui para o Calvário, seguiu a minha alma. Os caminhos não tinham sol, a tristeza foi mortal. No percurso da viagem fiz vários sacrifícios por amor do Senhor. Senti como se Ele tudo me rejeitasse. Com Ele subi até ao cimo da montanha. Naquela noite trevas e mar infinito de dor, Ele coberto de sangue, com as carnes despedaçadas, quase a agonizar, dizia-me em silêncio dentro do coração: “Ama-me, vê quanto sofri por ti!” Com Ele fui despojada dos meus vestidos, com Ele senti a vergonha, o pudor e com Ele fui crucificada. Nas horas de agonia senti que a nossa união era um contraste, era um anel que nos apertava e nos levava a viver a mesma vida. Agonizei com Jesus. eu bradava com Ele e ao nosso brado toda a terra estremeceu. Ele expirou. Tive que expirar com Ele. Não foi prolongado o silêncio da noite: Jesus cheio de vida e luz fez-me viver e dentro do meu coração falou-me assim:

— “Alegrai-vos, está aqui o Senhor. Desceu do Céu. Bendizei o Seu nome! Alegrai-vos! Está aqui Jesus. Está no seu trono, no seu paraíso de delícias. Alegrai-vos! Ele está aqui e vai falar aos vossos corações. Convido-vos, convido-vos a todos. Vinde a Mim! Vinde a Mim, filhos meus! Falo pelos lábios da minha vítima, falo e peço a toda a humanidade. Amai-me, amai-me. Quero ser amado. Está neste calvário a luz e o farol do mundo. Está neste calvário a escora da justiça do Senhor. Está neste calvário o íman atraente que atrai as almas ao Seu Coração. Está neste calvário o porta-voz de Jesus. Este calvário é um portento de graças. Este calvário é o calvário das maravilhas de Deus. Este calvário é, sobretudo, calvário do amor, do amor da louca do amor por Jesus. Criei-te por amor, minha filha. Por amar-te, escolhi esta nobilíssima missão. Por amor te conservo a tua vida aqui. Vives de Jesus. Vives da Eucaristia. Vives da vida divina. É o poder do Senhor aqui manifestado. Quero salvar-vos, filhos meus. Indico, manifesto pela minha vítima mais uma vez o caminho da salvação. Fala às almas, minha filha, fala às almas. Fala-lhes enquanto estás na terra. Do Céu, sim, do Céu dar-lhes-ás chuvas de bênçãos, chuvas de graças, chuvas de salvação.”

— Ó Jesus, ó Jesus, meu Amor, sou tão ignorante. Não sei dizer nada. Não sei falar às almas como me mandais. Ah! Se eu soubesse, Jesus!... Só Vós conheceis o que eu queria dizer-lhes. Aceitai todo o martírio do meu corpo e da minha alma. Todo o amor puro do Céu e da terra para suprirem a minha falta. Seja este amor quem fala, seja este amor que conquista para Vós as almas. Que dor a minha, meu Jesus, que dor a minha, meu Jesus! Eu não poder consolar-Vos! Eu não poder fazer tudo quanto me pedis!

Se tu soubesses, minha filha, se tu soubesses, florinha eucarística, o fruto do teu sofrimento, do teu esforço, da tua vida! Quantas vidas novas, quantas vidas novas, quantas vidas novas! Quantas vidas reviveram para a graça! Nada criei, nada faço, nada permito inútil. Tu és útil, útil. Tens a utilidade, a maior utilidade que pode ter uma alma na terra. A tua utilidade é salvadora. A tua vida, sim, minha filha, a tua vida é a continuação da vida redentora, da vida salvadora de Jesus. Fala às almas, fala às almas. O teu sofrimento fala sempre. O teu exemplo é uma pregação contínua. Avante, avante, missionária de Jesus, a maior missionária de Jesus na terra. Vinde, meus filhos, vinde, meus filhos, atendei à voz do Senhor, ouvi a voz do Senhor. Ele fala-vos, ele fala ao mundo, pelos lábios da Sua vítima, pela heroína deste calvário.”

— Falai, Jesus, falai Vós, sempre Vós. Falai por amor, falai pela Vossa sagrada Paixão e Morte. Falai pelas dores da Mãezinha. Falai pelo amor com que amais o Pai e o Espírito Santo. Falai e movei os corações. Falai e convertei os pecadores! Eu sou nada, Jesus, eu sou nada. Eu sou miséria; Vós sois tudo, Vós podeis tudo.

— “Coragem, filhinha, coragem. É comigo que és poderosa. É comigo que és triunfadora e vitoriosa na tua missão. É comigo que as tuas palavras vão penetrar nos corações mais endurecidos. Oh! Graça! Oh! Maravilha! Oh! Poder supremo deste calvário! Vem, minha filha, vem receber a gota do meu divino Sangue. Uniram-se os nossos corações. Foi o meu ao encontro do teu. Estão os dois num só a reviverem a mesma vida. Passou a gotinha de sangue e uma forte efusão de amor. O Sangue, que é a tua vida, o teu alimento, o amor para amares, o amor para amares e fazeres amar. Fica na tua cruz. Coragem, coragem. Jesus e a Mãezinha estão contigo. Tens a graça e a força divina. Tens o amor e o poder de Jesus. Tudo te dou, tudo te comunico. Distribui às almas, distribui ao mundo.”

— Ó Jesus, lembro-Vos as minhas intenções, as grandes intenções, todas as intenções e a humanidade inteira. Concedei graças, muitas graças, todas as graças que podeis conceder sem prejuízo das almas e da Vossa glória. Perdoai, Senhor, perdoai ao mundo. Perdoai, Senhor.

— “Vai, minha filha, vai em paz. Tem confiança, tem confiança. Pede oração, penitência. Vida pura, vida pura, pura.”

— Obrigada, Jesus. Obrigada, Jesus, obrigada, meu Amor.

 

Nota. – No dia 9 de Maio atendeu cerca de 2.000 pessoas, falando 4,30 horas de manhã. Teve um intervalo de 45 minutos e de tarde falou seguidamente 5 horas. Foram 9,30 horas que esteve a atender os visitantes. Veio um grupo de 21 pessoas a pé, do Porto. Outro grupo de 40 ciclistas. As outras pessoas vieram de caminheta, automóveis, de comboio, etc. Alguém disse-lhe: ― Deves estar muito cansada… Ao que respondeu: Eu era capaz de receber ainda outras tantas pessoas. Eu hei-de mirrar, hei-de dar todo o meu sangue a Nosso Senhor. Hei-de dizer que O amo, mas de dentro para fora. Hei-de bradar que amo a Jesus, hei-de dar-Lhe almas, muitas almas.

 

15 de Maio de 1953 – Sexta-feira

Que o Senhor seja comigo. Só Ele é a minha força, só com Ele posso mover meus lábios para dizer qualquer coisa do nunca acabar daquilo que me está na alma. Dolorosa e tremenda agonia! O brado da minha alma é por assim dizer contínuo; ele perde-se no meio dos montes e dos bosques; ele é abafado sob a montanha imensa do pecado e não chega até Deus. Eu brado e do Céu não tenho auxílio; ele está fechado com a enormidade dos meus crimes. Nuvens negras de ferro, umas sobre as outras me separam dele. Que dureza! Não há quem as quebre, não há quem as destrua e faça desaparecer. Nunca verei a Deus; nunca gozarei de Deus. Meu Deus, que pavor! Tudo isto que digo e sinto leva-me por vezes a grande desalento e desânimo; leva-me quase ao desespero pela inutilidade da minha vida. Tudo isto se passa na superfície, tudo isto é e não é meu. Mas a paz, a paz do Senhor mantém-se no meu íntimo o mais profundamente, como flor de estufa que nenhuma aragem nem rigor do tempo a pode manchar. Nunca direi o que sofro, nunca serei capaz de dizer por ser inigualável a minha ignorância. Nunca poderei dizer o martírio novo, o martírio cruel, o martírio nunca dito que me causam as numerosas visitas que vêm junto de mim. Não me causa martírio ouvir, sentir e compreender as suas misérias; não, não é isso, porque em impulsos de amor, parece até em excessos de loucura de amor, quero abraçá-las a todas e introduzi-las no Coração divino do meu Jesus. o que se passa em mim quando lhes falo, o que sinto quando lhes quero fazer compreender a grandeza do pecado, uma ofensa feita ao nosso Pai do Céu e o quanto Ele nos ama, não sei, parece que estou fora de mim, parece que me passo para outro mundo, parece que o meu espírito está mergulhado em Deus, na luz de Deus.

Estes sentimentos e compreensão tinham dizeres infinitos. E como hei-de dizê-lo eu, sendo tão má e nem sequer vermezinho da terra? Mas esse martírio novo de que acima falei é depois que estou sozinha, depois de tanto ter dito dentro da minha ignorância, depois de tanto ter ansiado de meter bandos, bandos de almas no Coração do meu Jesus, sinto a necessidade de lhes fugir, de a todas afastar e repelir de mim. Fico a tremer de pavor. É o mundo contra mim, é o ódio, é a maldade, é tudo o que é mau. Não tenho ninguém por mim a defender-me. Temo e tremo mergulhada neste abismo de sofrimentos. Parece que estou no meio dumas muralhas; não se ouvem cá fora os meus brados, os meus suspiros. O que fazer, meu Senhor? A Vossa divina vontade, só a Vossa divina vontade. A tudo isto se veio juntar a indiferença do Horto de ontem. Vivi como se Deus não existisse, nem os Seus pensamentos.

Era já noite e veio como que num painel Jesus padecente. Aquele painel penetrou em todo o meu ser, atravessou-me como o raio de sol pela janela. Fiquei a sentir os sofrimentos, tristezas e agonias de Jesus no Horto. Não faltaram espinhos a ferirem-me. No mesmo sentimento de dor segui hoje para o Calvário. O mesmo painel me atravessava o ser; o Sangue do divino Redentor corria pelo meu corpo; os seus suspiros profundos e silenciosos faziam-me suspirar a mim. A Sua cruz pesava sobre os meus ombros. Cheguei ofegante com Ele ao cimo do Calvário. Fui crucificada. Os Seus divinos olhos abriram-se com os meus a bradar ao eterno Pai. Ainda dentro do meu coração falava-me o amor de Jesus: “Vê quanto sofro. Vou morrer por ti.” A agonia aumentou e o amor superabundava tudo. Estendia-se por todo o mundo, por todo o calvário. Nesta abundância de amor e na agonia mais dolorosa, Jesus expirou. Senti como se o meu espírito, no mesmo momento, como um sopro, se fosse unir ao Pai. Reinou o silêncio da morte, e Jesus não se apressou a dar-me a vida. Quando veio, entrou triunfante, de braços abertos, cheio de glória, e falou-me assim:

— “Entrou o sol, entrou a vida, entrou o amor no coração da Sua vítima. Entrei, entrei, minha filha; sou o Sol, a Vida, o Amor do teu coração. É com este sol, vida e amor que tu hás-de entrar nos corações dos que se abeiram de ti. Entras e Eu entro contigo. É sol, vida e amor divino. Dou-me, dou-me, comunico-me por ti às almas. Este calvário. O teu coração tem doçuras, encantos que as atraem. És o íman atraente delas. Eu sou o íman que te atrai a Mim. Traz-mas, traz-mas contigo. Ó espelho, ó espelho cristalino da humanidade. Ó farol luminoso que dás luz ao mundo, ó escora fortíssima que sustentas o braço de meu Pai. Estás na vida pública de Jesus. Coragem, coragem, esposa querida. Tenho fome, tenho fome. Sacia-me. Tenho sede, tenho sede, tenho sede; dá-me de beber. Sacia a fome e a sede do teu Jesus. Tenho fome e sede de dor, tenho fome e sede de amor. A dor repara o meu divino Coração e o da minha Bendita Mãe. O amor é bálsamo para as nossas feridas. Quero almas, almas, sempre almas. O teu sofrimento é o meu sofrimento. As minhas ânsias, as tuas ânsias; o meu amor, o teu amor. A tua vida é a minha vida, minha filha, sim, a tua vida é a minha vida, é a vida de Jesus.”

— Ó Jesus, amo-Vos. Agora posso dizer-Vos que Vos amo. Amo-Vos e sou Vossa. Posso dizer-Vos e quero dizer-Vos: sou a Vossa vítima. Sede comigo, Senhor, nos meus desfalecimentos, sede comigo no meu pavor. Se Vós Vos consolais, se as almas se salvam, seja feita, Senhor, seja feita a Vossa vontade. Custe-me o que custar, abraço, abraço a minha cruz. É com ela, meu doce Amor, é com ela que eu me estreito mais docemente a Vós, meu Pai, meu Criador. Que mundo, que mundo de amor, meu Jesus. Que mundo! Mais, muito mais: que Céu de amor! Não tenho dúvidas, neste momento. Sei que sois Vós, meu Jesus.

— “Sou o teu Jesus de agora, minha filha. Sou o teu Jesus de sempre, ó florinha eucarística. Tem confiança! Não duvides! A tua missão é a mais alta, é a mais sublime. A tua missão é a mais dolorosa, a mais espinhosa. É nobilíssima, é grande como Deus. As almas, as almas têm a grandeza de Deus. Fala ao mundo, fala ao mundo. Dá por ele a tua vida. Morrer pelo mundo é morrer por Jesus. Morrer pelas almas é morrer por Jesus, só por Jesus. Alerta, alerta, pecadores. Alerta, ouvi a voz do Senhor. Escutai, escutai o que se ouve ao longe, mas um longe que se apressa, um longe que se aproxima, um longe que é breve. Escutai, escutai: são ruídos produzidos pela justiça do Senhor. Faça-se oração, faça-se penitência. Haja emenda de vida. Coragem, coragem, “mãe dos pecadores”. És mãe, porque lhes dás a vida com o teu calvário. És mãe porque dás a milhões, a milhões, a milhões a vida da graça. Vem receber a gota do meu divino Sangue. Os anjos uniram os nossos corações. A gotinha do Sangue passou. Vida nova, vida pura, vida santa. Esta gotinha com a Eucaristia dá a vida ao mundo, a vida ao mundo. É por ti que ela lhe é dada. Fica, fica na tua cruz. Coragem, coragem, para ti e para os que dela necessitam.”

— Lembrai-Vos, Jesus, dos pedidos desta pobrezinha. Atendei, atendei, Senhor. Consolai a todos. Atendei e perdoai ao mundo. Atendei e confortai as almas aflitas e atribuladas.

— “Vai em paz. Consolo-as por ti. Falo em teus lábios.”

— Obrigada, Jesus. Obrigada, Jesus.

22 de Maio de 1953 – Sexta-feira

Sinto a necessidade de desabafar, falar da dor, não porque queira queixar-me, porque isso não quero fazer e quero a todo o custo encobri-la, mas não sei porquê, não sei o que me leva a falar dela. É talvez a minha pobre natureza; sou talvez eu por não saber sofrer, que sinto a necessidade de dizer que sofro. Ah! A minha dor é tão grande! Ela cobre o mundo, ela vai ao encontro de Jesus, vai tocar e ferir o seu divino Coração. Que grandeza a da minha dor! Eu não posso consentir que ela vá ferir o Coração do meu Senhor. Ela sai de mim, de dentro do meu peito como o maior rio que nunca seca e nunca cessa de encher o mar. Meu Deus, como eu sofro por Vos sentir sofrer! Meu Deus, como eu sofro por ver e sentir este rio caudaloso a sair do meu peito e a ir ferir o Vosso divino Coração, produzindo nele um ar infinito de dor. Se os Anjos ou os Santos falassem por mim! Só eles saberiam exprimir-se. Eu não sei, Senhor, eu não sei. Que grande, que grande, que nunca dita é a minha ignorância! Esse mar infinito para onde corre a minha dor, a dor que vai ferir o meu amantíssimo Jesus vem também de encontro ao meu peito, para o meu coração: um mar infinito, um mar que nunca terá fim, nem poderá esgotar-se o seu amor. É esse amor que me atrai, é esse amor que não posso deixar de anunciar. Trabalha em mim como que um motor; este motor tem voz que se espalha, voz que ecoa no mundo inteiro, voz que junta o humano com o divino, voz que levanta a terra para o Céu. Quantas coisas sabe sentir o meu coração e a minha alma e não as sabe dizer! Que pavoroso martírio para mim! Quero abraçar o mundo, quero abraçar as almas, quero num abraço divino estreitá-las, metê-las todas no peito, no Coração de Jesus. é uma ânsia tormentosa, é uma ânsia sem limites, sem fim. Ai, que grande, ai, que grande! Tem a grandeza de Deus! Quero abraçá-las, quero possuí-las e quero repeli-las, tenho que repeli-las. A minha natureza não pode mais. A vontade louca por Jesus e pelas almas atira-se ao mar imenso, ao mar infinito de dor e do amor. Mas a natureza apavorada não pode mais, teme e morre de medo. Estou esmagada com a humilhação de tantas visitas, de tantas almas que se abeiram de mim. Tenho chorado por mais e mais reconhecer o meu nada; choro por ver o abismo da minha miséria, vejo e sinto que é esse abismo de maldades que elas vêm ver. Não posso nem sei dizer mais. Fico em indizível dor por nada ter dito.

O meu Horto de ontem foi o sentimento e a visão de Jesus sentado no meu coração a chorar sobre a cidade de Jerusalém. Gravaram-se bem profundamente os seus tristes e penetrantes olhares. Jesus conservou-se por muito tempo nessa atitude. Em seguida fui presa com Ele e, logo após a prisão, Ele conservou-se dentro em mim na mesma tristeza e atitude, só a mais com a Sua sacrossanta cabeça coroada de espinhos a derramar muito sangue. E hoje assim segui para o Calvário. Jesus não se levantou do meu peito, derramava o mesmo Sangue, sofria em silêncio a maior dor e agonia. Cansava-me o coração o palpitar aflitivo do Coração de Jesus. Sofríamos os dois como se fosse um só. Despida e pregada na cruz com Ele, fiquei até ao fim na agonia mais dolorosa. O palpitar do Coração de Jesus parecia que me arrancava o meu e mo tirava do peito. O suor e o sangue de Jesus banhavam-me e num brado de agonia e amor entreguei ao Pai o meu espírito. Reinou o silêncio da morte em todo o calvário. De repente, Jesus veio, cheio de amor e falou-me assim:

— “Desceu do Céu a luz, o sol, a vida, desceu e veio penetrar neste calvário. Desceu Jesus. É o sol divino. Veio iluminar e fazer reviver o coração da Sua esposa. Avante, avante, minha filha. Avante, sempre avante, florinha eucarística. O Senhor é contigo. Embriaga-te no Seu amor, embriaga-te o teu Senhor, o teu Deus. Avante, avante, louquinha de Jesus, louquinha das almas. Oh! Como é bela, como é encantadora a tua missão! O Senhor desceu sobre ti. Tem por ti a maior predilecção. Tem coragem! O Céu está tão pertinho! Coragem, sempre coragem, enquanto estás na terra. O campo da tua missão é a humanidade inteira. Fala às almas, fala às almas. Fala-lhes sempre do meu amor. Fala-lhes da minha misericórdia. Não ponhas de parte, filha minha, a minha justiça.”

— Ó meu Jesus, ó meu Jesus, tenho tanto medo da minha vida! Vede, vede como é grande o meu temor. Parece que estou a enganar-me e a mentir-me a mim mesma. Eu não desempenho como devo a minha missão, meu Jesus. Sinto-me fraquejar, sinto-me morrer. Quanto mais falo de Vós, do Vosso amor, da Vossa grandeza, mais sinto e vejo a minha miséria. Ó Jesus, que humilhação tão grande, que humilhação tão grande! Só os meus crimes e o meu nada aparecem. Como poderei eu assim fazer alguma coisa?!

— “Coragem, coragem, pomba branca. Esvoaça, esvoaça sobre os sacrários. Deixa cair sobre eles o aroma, a fragrância das tuas virtudes, das tuas virtudes. Esvoaça, esvoaça até Deus. Sobe, sobe às alturas. Mostro-te, mais do que nunca, a tua miséria. Quanto mais te conheces, mais me fazes conhecer a mim. Preparei e velo por ti na tua nobilíssima missão. Quero almas, almas, um mundo de almas. Vejo-as fugir, vejo-as fugir. Vai à procura delas, vai, corre à sua procura.”

— Porque chorais? Porque chorais, meu Amor? Quem é que Vos arrasta, quem Vos atou à cintura tão grossas cordas? Não choreis, não choreis, meu doce Amor. Dou-Vos o meu coração que está a arder com o fogo divino. Seja este fogo, este fogo, meu Jesus, que Vos seque as lágrimas. É fogo Vosso. Utilizai-Vos do que Vos pertence.

— “Choro, choro, minha filha, porque os pecadores me ferem. Choro, porque as almas de quem tanto esperava me perseguem. Choro, choro, porque o mundo se perde. Mas, agora, esposa querida, pupila dos meus olhos, não chorarei mais. Quero encorajar-te, quero mostrar-te quão necessária é a tua missão. Quero amor, quero amor! Faz que eu seja amado. Não quero ser ofendido. Repara o meu divino Coração. Tem coragem, tem coragem! As almas, as almas que vieram por ti ao meu divino Coração são tantas, tantas!... Faz que elas enceleirem tudo o que de mim recebeste. Faz que elas venham para mim como formiguinhas para o celeiro. Vem receber a gota do meu divino Sangue. Os nossos corações uniram-se. Nova gota de Sangue recebeste. Nova vida para mais dor, nova dor para mais amor. Passou a vida de que tu vives. Com a gotinha do Sangue renovei a abundância dos meus tesouros. São para as almas, são para as almas. Distribui, distribui como quiseres. Trá-las todas, todas para junto de mim.”

— Farei o que puder, mas só com Vós conto, Jesus, não Vos ausenteis já. Ouvi os meus pedidos. Ouvi, ouvi, meu Jesus. Lembro-Vos todos, todos quantos me são queridos, todos aqueles que me pedem orações ou querem pedir, Jesus, e lembro-Vos a humanidade inteira. Perdoai-nos a todos, Jesus, e a todos nos dai a Vossa graça, o Vosso perdão, a Vossa misericórdia, o Vosso amor.

— “Fica no Calvário, no meu glorioso calvário que Jesus tem na terra. Coragem, coragem! Vai para a tua cruz.”

— Obrigada, obrigada, meu Amor.

29 de Maio de 1953 – Sexta-feira

Hoje nada vou dizer. Não posso. Que tremendo tem sido o meu calvário. Só o amor de Jesus e das almas me sujeita a tanto sofrer. Tive no meu quarto a Santa Missa: parece que nem estou presente, tal é a vida da minha alma. Sinto como se estivesse fora do mundo. Sem ter vida, vivo não sei onde. Estive morta ontem sobre o solo do horto e hoje morta estive no calvário. Perto de expirar, num impulso de amor, ressuscitei e abracei o calvário, abracei a cruz. Momento depois voltei a expirar, mas expirei com Jesus. Veio Ele de novo com a Sua vida, entrou no meu coração, sentou-se como Rei e falou-me assim:

— “O Céu é belo, belo, belo! Tem encantos sem igual! Dá-o às almas, minha filha, dá-o às almas. Avante, avante, avante! Coragem heróica! O Senhor está contigo, minha filha. Foste criada para as almas. Foste criada para, pelos teus sofrimentos, pela tua imolação, dares o Céu. É belo, é belo, é belo!... Será bem depressa para ti. Tudo se encaminha para a tua verdadeira vida. Coragem, coragem, esposa predilecta de Jesus. Se soubesses o que se passa nas almas! Se pudesse compreender a revolução que nelas se levantou e levantará! É pecado contra a graça. É o mundo contra o Céu. É Jesus, é Jesus, o Pai de toda a humanidade a tentar salvá-la. Coragem, coragem, heroína minha. À minha semelhança, tu dás-lhes a vida, tu dás-lhes o Céu.”

— Só uma coisa me resta, Jesus: confiar em Vós, confiar cegamente. O que posso eu dar, se eu nada sou?! Vós é que sois tudo. Não vedes Vós as minhas impaciências?! Tiro ao meu esforço todo o valor, não é, meu Jesus?

— “Confia, confia, esposa querida, florinha eucarística. Eu não te deixo um só momento. Precisas que eu vele por ti. São necessárias as tuas faltas involuntárias para esconder tanta e tanta grandeza. Para a mais alta missão, a mais alta preparação. Foste criada e preparada para as almas. Foste posta por Jesus neste calvário, calvário prodigioso, calvário das maiores maravilhas de Jesus. Confia, confia, minha filha. A revolução inaudita das almas faz que elas venham aos milhares, aos milhões ao meu divino Coração. No Céu, no Céu, tu vais continuar – disse-te, digo-te – a tua missão encantadora, sublime… vai ser sempre desempenhada. Ditosas as almas que vêm junto de ti. Ditosas as almas que invocaram o teu nome quando estiveram no Céu. Promessas divinas, promessas sagradas.”

— Ó Jesus, sou uma bola, sou uma rodilha: bola que todos jogam, rodilha a que todos se limpam. Ai, que humilhação tão grande, Jesus! Falai-me do Vosso amor. Falai só do que é Vosso.

— “Falando de ti, falo do que é meu. Tu és bola., és rodilha porque és vítima. Tenho todo o direito. Posso dizer-te tudo. Para tudo te preparei. És farol e luz do mundo. És vida que fazes viver. Fala, fala tu do meu amor. Criei-te por amor, por amor te coloquei neste calvário. Que loucura, que loucura tenho pelas almas!... Diz-lhes, diz-lhes muitas coisas minhas. O Espírito Santo está contigo. Todo o teu ser está mergulhado na Sua luz, na Sua vida. No teu coração, nos teus lábios falo eu. Este calvário, este quartinho é o Céu na terra. Vem, vem, recebe a gota do meu divino Sangue. Os anjos uniram os nossos corações. Passou a gotinha do Sangue, o teu alimento, a tua vida. Passou juntamente a efusão do meu amor. É a fragrância que as almas de ti recebem. Dá-lhes, dá-lhes toda esta vida. É a vida divina, é a vida celeste, é a vida que tu vives na terra. Fica na tua cruz. Fica nela crucificada. É cruz vitoriosa. É cruz de martírio, mas é cruz de salvação. Coragem, coragem! Grande prémio te espera, grande recompensa, minha esposa querida. Grande recompensa recebem todos os que te auxiliam, amparam e rodeiam. Fica na tua cruz com alegria. Vai em paz! Dá a minha paz! Não cesses de pedir para que Eu seja amado e seja amada a minha Bendita Mãe. Não cesses de pedir vida nova, vida pura, vida santa.”

— Ó Jesus, antes da Vossa partida para o Céu, ouvi a Vossa pobre filhinha, a mais indigna filhinha. Lembro-Vos as minhas primeiras intenções, todas as intenções e a humanidade inteira. As minhas primeiras intenções, as três intenções que me mandaram pedir.

— “O caso é grave, minha filha. É necessária muita violência ao Céu e muita correspondência à graça. Pede sempre, pede sempre, pede sempre! E pede ao mundo inteiro penitência e oração.”

— Obrigada, Jesus, obrigada, meu Amor.