SITE DOS AMIGOS DA BEATA ALEXANDRINA

     

Capítulo 7°

Espírito de mortificação

Em suas notas biográficas escreve a Alexandrina resumidamente:

Sem saber como, ofereci-me a Nosso Senhor como vítima e vinha desde há muito tempo pedindo amor ao sofrimento. Nosso Senhor concedeu-me tanto, tanto esta graça, que hoje não trocaria a dor por tudo quanto há no mundo. Com este amor à dor, toda me consolava em oferecer a Jesus todos os meus sofrimentos; A consolação de Jesus e a salvação das almas era o que mais me preocupava.

Mais adiante diz assim:

Tudo queria fazer por seus amores (de Jesus e Maria) e, para provar que os amava, algumas vezes fazia bolinhas de cera e atava-as na ponta dum lencinho e com ele batia no meu corpo, escolhendo os lugares onde mais podia sofrer, como fosse nos joelhos e sobre os ossos, ficando com o meu corpo denegrido das pancadas. Outras vezes atava a trança do meu cabelo aos ferros da minha cama e puxava a cabeça com toda a força para a frente, para assim mais poder sofrer. Ou então dava nós na ponta da trança, açoitando-me com ela nas costas, no peito, nos braços...

Na tarde dum domingo (foi à 14 de Outubro de 1934), tinha tantas ânsias de amor divino, não cabendo em mim de ansiedade, suspirava por ficar sozinha vendo partir todos os meus para a igreja… Logo que me deixaram a sós com o meu. Jesus, foi então que Lhe provei quanto O amava. Peguei num alfinete que segurava as minhas medalhinhas, espetando-o sobre o meu coração, mas como não visse aparecer sangue, enterrei-o mais ainda e retorci as fibras até elas rebentarem, surgindo sangue. Tomei a caneta e um santinho e com o meu sangue escrevi:

Com o meu sangue Vos juro amar-Vos muito, meu Jesus, e seja tal o meu amor que morra abraçada à cruz.

Alexandrina Maria da Costa

E ainda acrescentou:

Amo-vos, e morro por Vós, meu querido Jesus, e nos vossos sacrários quero habitar, ó meu Jesus.

Balasar, 14-10-1934.

Acrescenta depois que ao contar isto ao director espiritual, este lhe proibiu de fazer coisas deste género[1].

Por tudo o que sei da Alexandrina, atrevo-me a afirmar que não será fácil encontrar alma que tenha amado mais a cruz do que ela.

Em primeiro lugar, no grande martírio que lhe causava a sua doença principal (mielite lombar) e de que esteve entrevada mais de 30 anos, nunca houve uma falta de resignação ou de impaciência. Depois há nela uma visão clara do valor do sofrimento; são abundantíssimos os documentos que o abonam.

Por exemplo, a 15/II/40, depois de mostrar quanto deseja consolar a Jesus, exclama:

Vem, ó dor amada, vem, ó dor querida; és tu e só tu que me unes a Jesus! Ó dor, ó farol que me guias para o meu Criador!

E daí a onze dias, escreve:

Ó dor, ó bendita dor! Ó cruz, ó leito sagrado, quero que sejas tu a minha sepultura, donde jamais me possa levantar! Tu és, ó cruz bendita, o tesoiro imenso com que Jesus me enriqueceu. Eu te quero, eu te abraço, em ti quero estar cravada e toda de espinhos cercada!

É por Jesus que quero viver ferida e no altar com Ele sempre imolada! Ditosa sorte que me espera na terra; ditosa me fará eternamente no Céu.

A este conhecimento claro do que é a dor, junta-se um amor nunca desmentido à cruz, sempre pronta para toda a espécie de sacrifícios e eles foram inúmeros, ininterruptos e de todas as espécies. Ela acolhia-os sempre com todo o heroísmo, oferecendo-se invariavelmente ao Senhor para mais e pedindo-Lhe até que invente sofrimentos novos. Nosso Senhor fez-lhe bem a vontade até à morte.

Já a 2/III/36 declarava ela:

Se fosse possível eu sofrer todos sofrimentos do mundo, contanto que Nosso Senhor fosse amado por todos, eu não me recusava a isso. Digo isto muitas vezes a Jesus: – Quem me dera poder-Vos consolar, dizendo-Vos: Vós já não sois mais ofendido, nem Vos vão mais almas para o inferno; Vós sois amado e conhecido por todos! Ó sim: eu quero sofrer muito, para que o vosso sangue não seja derramado inutilmente por nenhuma alma.

A 21/XI/36 encontramos o que Santo Inácio de Loiola chama, nos seus Exercícios Espirituais, o terceiro grau de humildade:

Bendito seja o meu querido, que me deu a maior riqueza que me podia dar já nesta vida: deu-me os sofrimentos, deu-me a maior felicidade! Penso para mim que não é nada uma eternidade inteira para eu O amar, louvar e agradecer por tantas graças, tantos benefícios e tantas riquezas que Ele me tem dado.

Ó meu bom P., digo isto de todo o meu coração: se me viessem agora dizer que o resto do tempo que tenho para viver o passava sem mais sofrimentos e que tinha a mesma glória no Céu, como se sofresse, eu responderia: não, mil vezes não! Foi pelo sofrimento que me foram abertas as portas do Céu. Eu ter a dita de me assemelhar tanto ao meu querido Jesus crucificado, e desprezá-la? Não, isso não; sofrer, e sofrer sempre. Amor com amor se paga. Foi por meu amor que Jesus sofreu e morreu e só por amor quero eu também sofrer e morrer. Eu tenho vivido num contínuo abandono espiritual. Estou à prova; mas seja em tudo feita a vontade de Nosso Senhor.

Esta passagem não precisa de comentários; impõe-se por si mesma. Noutra, a 3/XII/36, exclama:

Ao contemplar Nosso Senhor Jesus Cristo crucificado, ao recordar quanto Ele sofreu por mim, não Lhe posso recusar nada; só, Lhe repito e quero repetir: mais, meu Jesus, mais! E Nosso Senhor aceita; tem sempre que repartir comigo. É tal a minha desolação e frieza em que me encontro que me faz lembrar quando pega o fogo numa casa, que queima tudo, só lhe ficam as ruínas. Pobre de mim! É o que eu encontro: uma vida de pecados e desgostos para Nosso Senhor; nada mais tenho…

A 18/XII/37 escreve, no meio de grande tribulação interior:

Então já acabou o retiro? Já sabe a certeza da intrujona que eu sou? Quanto o tenho enganado? É o que me tem dito o demónio. Deus louvado, nunca pensei em enganá-lo, antes pelo contrário, me tenho esforçado quanto possível por o fazer conhecer a minha miséria e o quanto tenho ofendido o meu querido Jesus...

Nosso Senhor há dias que me tem a jejum. Tanto vale eu chamar como estar calada. Ele não me fala nem se faz sentir. Há dias, numa ocasião que eu sentia grande aflição na minha alma e dizia:

Ó meu Jesus, crucificai-me a valer na alma e no corpo, como se não tivésseis pena de mim. Tratai-me como se me não tivésseis amor. Fingi que me abandonais, contanto que Vos esqueçais dos crimes dos pecadores e que Vos lembreis só do amor que lhes tendes, para os conduzires (sic) ao bom caminho.

Não sei se Nosso Senhor aceitou a minha oferta, mas talvez aceitasse.

Este ponto, porém, ficará mais claro depois de explicado o seguinte.


[1] Conservamos esta estampinha como preciosa relíquia.

   

PARA QUALQUER SUGESTÃO OU INFORMAÇÃO