CAPÍTULO 13

Continua a tratar do primeiro grau de oração e dá uns conselhos para algumas tentações que o demónio apresenta algumas vezes. É muito proveitoso.

1.  Parece-me bem falar de algumas tentações que tenho visto haver ao princípio ― algumas tenho-as eu tido ― e dar alguns avisos sobre coisas que julgo necessárias. Procure-se andar ao princípio com alegria e liberdade, porque há pessoas a quem parece que se lhes vai a devoção se se descuidam um pouco. Bom é cada qual andar com temor para não se fiar pouco nem muito de si mesmo, pondo-se em ocasiões em que lhe é fácil ofender a Deus. Isto é muito necessário até já se estar muito forte na virtude. E não há muitos que o estejam tanto que, metidos em ocasiões favoráveis ao seu natural, se possam descuidar. Que sempre ― enquanto vivemos, e até por humildade ― é bom conhecer a nossa miserável natureza. Mas há muitas coisas em que se pode, como já disse, tomar recreação, mesmo para se voltar mais forte à oração. Em tudo é preciso discrição.

2.  Ter grande confiança, pois convém muito não apoucar os desejos, mas esperar de Deus que, se nos esforçamos, pouco a pouco ― embora não seja logo -poderemos chegar aonde muitos santos chegaram com Seu favor. Se eles nunca se tivessem determinádo a desejá-lo e pouco a pouco pô-lo por obra, nunca teriam subido a tão alto estado. Quer Sua Majestade e é amigo de almas animosas, logo que andem com humildade e sem nenhuma confiança em si. Não tenho visto a nenhuma destas que se fique cá por baixo neste caminho, nem a nenhuma alma cobarde ― sob capa de humildade que ande em muitos anos o que essas outras andam em muito poucos. Espanta-me o muito que faz neste caminho o animar-se a grandes coisas; porque, embora depois a alma não tenha forças, dá um voo e chega a muito, ainda que ― como avezita que tem fracas penas ― se canse e fique mais algum tempo.

Isto aproveitou-me muito como aquilo que diz Santo Agostinho: «Dá-me, Senhor, o que me mandas e manda o que quiseres». Pensava muitas vezes que S. Pedro nada tinha perdido em se lançar ao mar, embora depois temesse. Estas primeiras determinações são grande coisa, ainda que, neste primeiro estado, seja preciso ir-se detendo e ater-se à discrição e parecer do mestre; mas há-de olhar-se a que seja tal, que não ensine a andar como sapos nem se contente com que a alma se afaça a só caçar lagartixas.

A humildade, no entanto, sempre à frente para se compreender que não hão-de vir ― estas forças ― das nossas.

4.  Mas é mister entendermos como há-de ser esta humildade, porque penso que o demónio faz muito dano, a fim de que não vão muito adiante almas que têm oração, fazendo-lhes compreender mal a humildade, e que lhes pareça soberba o ter grandes desejos e querer imitar os santos e desejar o martírio. Logo nos diz ou dá a entender que as coisas dos santos são para admirar, mas não para as fazermos nós que somos pecadores.

Isto também o digo eu; mas temos de olhar ao que é de espantar 6 e ao que é de imitar. De facto, não seria bem que uma pessoa fraca e enferma se expusesse a muitos jejuns e penitências ásperas, e fosse para um deserto onde não pudesse dormir nem tivesse que comer, ou coisas semelhantes. Mas sem pensar que nos podemos esforçar com o favor de Deus a ter um grande desprezo do mundo, a não estimar honras, nem estar atido à fazenda. Temos uns corações tão apertados, que parece nos há-de faltar a terra em querendo-nos descuidar um pouco do corpo para darmos ao espírito. Depois nos parece que ajuda ao recolhimento ter muito bem consertado tudo o que é preciso, porque os cuidados inquietam a oração.

A mim, isto me pesa; termos tão pouca confiança em Deus e tanto amor próprio, que nos inquiete este cuidado. E assim é que, onde o espírito está tão pouco medrado como isto, umas ninharias nos dão tão grande trabalho como a outros coisas grandes e de muito tomo. E, a nosso juízo, presumimos de espirituais!

5.  Parece-me agora a mim esta maneira de caminhar a querer conciliar corpo e alma para não perder cá na terra o descanso e gozar lá no Céu de Deus. E assim será, se andarmos em justiça e apegados à virtude, mas é passo de galinha; nunca com ele se chegará à liberdade de espírito. Maneira muito boa de proceder, me parece, para o estado de casados, que hão-de viver conforme à sua vocação; mas para outro estado, de maneira alguma desejo tal maneira de aproveitar, nem me farão crer que é boa. Tenho-a experimentado e sempre me ficaria assim, se o Senhor, por Sua bondade, não me tivesse ensinado outro atalho.

6.  Ainda que, nisto de desejos, sempre os tive grandes, procurava isto que tenho dito: ter oração e viver a meu belo prazer. Creio que, se tivesse tido quem me lançasse a voar, mais me teria eu empenhado em que estes desejos fossem com obras. Mas são ― por nossos pecados ― tão poucos e tão contados os que não tenham neste caso discrição demasiada, que julgo ser isto causa bastante para os que começam, não chegarem mais depressa a uma grande perfeição. O Senhor nunca falta, nem é por Ele que há falha; nós é que somos os faltosos e miseráveis.

7.  Também se podem imitar os santos procurando solidão e silêncio e outras muitas virtudes, que não nos matarão estes negros corpos que tão concertadamente se querem levar para desconcertar a alma. E o demónio ajuda muito a torna-los inaptos; quando vê um pouco de temor. Mais não quer para nos dar a entender que tudo nos há-de matar e tirar a saúde; até o ter lágrimas faz-nos temer de cegar... Passei por isto e por isso o sei, e não sei que melhor vista nem saúde podemos desejar que perdê-la por tal causa.

Como sou tão enferma, até que me determinei a não fazer caso do corpo nem da saúde, sempre estive atada, sem valer para nada; é ainda agora faço bem pouco. Mas quis Deus que eu entendesse este ardil do demónio; e quando ele me punha diante ó perder a saúde, dizia: «Pouco vai em que eu morra». Quando era o descanso: «Não tenho necessidade de descansar, mas sim de cruz». E assim outras coisas. Vi claramente que, em mui muitas delas, embora eu de facto fosse muito enferma, era tentação do demónio ou frouxidão minha. Desde que não ando com tantos cuidados e não sou tão amimada, tenho muito mais saúde.

Assim vai muito de, nos princípios ― ao começar a ter oração ― não apoucar os pensamentos. Creiam o que digo, porque sei isto por experiência. E, para que escarmentem em mim, poderá também aproveitar o dizer estas minhas faltas.

8.  Outra tentação que há logo muito de ordinário, é desejar que todos sejam muito espirituais, pois começam a saborear o sossego e o lucro que ele traz. Desejar isto não é mal; o procurá-lo é que poderá não ser bem se não há muita discrição e dissimulação para proceder de modo a não parecer que querem ensinar; porque neste caso, quem quiser fazer algum bem, precisa de ter as virtudes muito fortes para não causar tentação aos outros.

Aconteceu isto comigo ― e por isso o compreendo ― quando procurava, como já tenho dito, que outras tivessem oração. Como, por um lado, me viam enaltecer o grande bem que era ter oração e por outro lado me viam com grande pobreza de virtudes, trazia-as eu tentadas e desatinadas, como depois me disseram. E tinham sobrada razão, porque não percebiam como se podia harmonizar uma coisa com a outra. E fui eu causa de não terem por mal o que de si o era, por verem que o fazia algumas vezes, parecendo-lhes haver algum bem em mim.

9.  E isto faz o demónio: parece ajudar-se das boas virtudes que temos para autorizar ― no que pode ― o mal que pretende. Por pouco que este seja, quando é numa comunidade, deve ganhar muito, quanto mais que o que eu fazia de mal o era muito, muito. E assim, em muitos anos, só três aproveitaram do que lhes dizia; mas depois, quando o Senhor me havia já dado mais forças na virtude, em dois ou três anos aproveitaram muitas, como depois direi.

E, além disto, há outro grande inconveniente que é prejudicar a alma; pois o que mais havemos de procurar ao princípio é de cuidar só dela, fazendo de conta que não há na terra senão Deus e ela; e isto é o que muito lhe convém.

10. Dá ainda outra tentação que é sentir pena dos pecados e faltas que se vêem nos outros. É que todas elas vêm com capa de zelo pela virtude que é mister entender e andar com cuidado. Persuade o demónio que a pena é só por se querer que não se ofenda a Deus e pesar-lhes por Sua honra, e logo o querem remediar. Inquieta isto tanto que impede a oração, e o maior dano é pensar que é virtude e perfeição e grande zelo de Deus.

Deixo a pena que dão os pecados públicos ― se o houvesse por costume ― duma Congregação ou os males da Igreja, dessas heresias onde vemos perderem-se tantas almas. Este pesar é muito bom e, como tal, não inquieta. A certeza será pois, para a alma que tiver oração, descuidar-se de tudo e de todos e tomar conta de si mesma e em contentar a Deus. Isto convém muito, muito, porque, se fosse dizer os erros que tenho visto cometer, fiados na boa intenção! ...

Procuremos, pois, atender sempre às virtudes e às coisas boas que virmos nos outros e tapar seus defeitos com os nossos grandes pecados. E com esta maneira de agir - embora não se faça logo com perfeição ganha-se uma grande virtude, que é: de termos a todos por melhores do que nós. E começa-se a lucrar por aqui com o favor de Deus que é necessário em tudo, e, quando falta, escusadas são as diligências. Supliquemos-Lhe que nos dê esta virtude, pois, fazendo nós o que está em nossas mãos, Deus não faltará.

11. Atendam também a este aviso os que discorrem muito com o entendimento, tirando de uma coisa muitas outras e conceitos. Aos que não podem obrar com ele ― como a mim me acontecia ― não há mais a dizer senão que tenham paciência até que o Senhor lhes dê em que se ocupem, e luz, pois podem tão pouco por si mesmos que o entendimento mais os embaraça que ajuda.

Pois voltando aos que discorrem, digo que não se lhes vá todo o tempo nisso; embora seja muito meritório, porque ― como é oração saborosa parece-lhes que não há-de haver dia de domingo, nem momento que não seja de trabalho. Logo julgam perderem o tempo e eu tenho por grande ganho esta perda. Mas antes ― como tenho dito ― imaginem-se diante de Cristo e, sem cansaço do entendimento, estejam falando e regalando-se com Ele, sem se cansarem a compor razões, mas apresentando-Lhe necessidades e a razão que Ele tem para não nos sofrer ali; uma coisa a um tempo e outra a outro, para que se não canse a alma de comer sempre o mesmo manjar. Estes são muito gostosos e proveitosos ― se o paladar se acostuma a comer deles ― e trazem consigo grande sustento para dar à alma vida e grandes lucros.

12. Quero-me explicar melhor, porque estas coisas de oração são todas elas dificultosas e, se não se encontra mestre, muito más de entender. Isto faz que, embora eu quisesse abreviar ― e bastava apenas menciona-las, para o bom entendimento de quem me mandou escrever estas coisas de oração a minha rudeza não dá lugar a dizer e dar a entender em poucas palavras uma coisa que tanto importa declarar bem. Eu passei tanto que tenho dó dos que começam só com livros porque é coisa estranha quão diferentemente se entende o que ali se vê, depois de experimentado. Pois, voltando ao que dizia, ponhamo-nos a pensar num passo da Paixão, digamos, o de quando o Senhor estava atado à coluna. Anda o entendimento rebuscando o que ali há a considerar: as grandes dores e pena que Sua Majestade teria naquela soledade e outras muitas coisas que, se o entendimento é vivo, poderá deduzir daqui. E então, se se é letrado!? Este é o modo de oração por que todos hão-de começar e continuar e acabar; é mui excelente e seguro caminho, até que o Senhor os leve a outras coisas sobrenaturais.

13. Digo «todos»; mas, no entanto, há muitas almas que tirarão mais proveito de outras meditações do que na da sagrada Paixão pois, assim como há muitas moradas no Céu, há muitos caminhos. Algumas pessoas aproveitam considerando-se no inferno, outras no Céu ― e afligem-se em pensar no inferno ― outras na morte. Algumas, se são ternas de coração, doem-se muito de pensar sempre na Paixão e regalam-se e tiram fruto em contemplar o poder e a grandeza de Deus nas criaturas e o amor que nos teve, o qual se manifesta em todas as coisas. E é admirável maneira esta de proceder não deixando, no entanto, muitas vezes a Paixão e vida de Cristo, que é donde nos veio e vem todo o bem.

14. É necessário que esteja de aviso o que começa, para verem que aproveita mais. Para isto, é muito necessário ter mestre experimentado; que, se não, muito pode errar e trazer uma alma sem a entender nem deixar que ela se entenda a si mesma. Pois, como esta sabe que é grande mérito estar sujeita a um mestre, não ousará sair daquilo que lhe mandam.

Eu tenho encontrado almas encurraladas e angustiadas por não ter experiência quem as ensinava, que me faziam lástima. Algumas nem sabiam já que fazer de si; porque, não entendendo eles o espírito, afligem alma e corpo e impedem o aproveitamento. Uma, que tratou comigo, tinha-a o mestre atada, havia oito anos; não a deixava sair do próprio conhecimento. E o Senhor tinha-a já em oração de quietude e assim passava muito trabalho.

15. Embora isto do conhecimento próprio jamais se deva deixar, não há alma tão gigante que não tenha muitas vezes de tornar a ser menino e de mamar (e isto jamais se olvide e quiçá o direi mais vezes, porque importa muito). É que não há estado de oração tão subido que não seja muitas vezes necessário tornar ao princípio. E isto dos pecados e conhecimento próprio é o pão com que todos os manjares se hão-de comer, por delicados que estes sejam, neste caminho de oração e sem este pão elas não se poderiam sustentar. Mas há-de comer-se com conta e medida. Depois que uma alma se vê já rendida e entende claramente que de si não tem coisa boa, e se sente envergonhada diante de tão grande Rei, e vê o pouco que Lhe paga para o muito que Lhe deve, que necessidade há de gastar aqui o tempo? mas sim irmos a outras coisas que o Senhor nos põe diante e não há razão para que as deixemos, pois Sua Majestade sabe melhor do que nós o que nos convém comer.

16. Assim importa muito que o mestre seja avisado ― digo, de bom entendimento ― e que tenha experiência. Se com isto tem letras, é grandíssima coisa; mas, se não se podem encontrar estas três coisas juntas, as duas primeiras importam mais, porque letrados podem procurar para com eles comunicarem quando tiverem necessidade. Digo que nos princípios, se eles não têm oração, aproveitam pouco as letras? Não digo que não se trate então com letrados, porque espírito que não vá fundado na verdade, eu mais o quisera sem oração. Grande coisa é ter letras, porque estas nos ensinam aos que pouco sabemos e nos dão luz e, apoiados nas verdades da Sagrada Escritura, fazemos o que devemos. De devoções tontas, livre-nos Deus!...

17. Quero-me explicar melhor, pois creio que me meto em muitas coisas. Sempre tive esta falta de não me saber dar a entender ― como já tenho dito ― senão à custa de muitas palavras. Começa uma freira a ter oração; se um simplório a dirige e se a este assim se lhe afigurar, dar-lhe-á a entender que é melhor obedecer-lhe a ele do que ao superior; e isto sem malícia, mas pensando que acerta, porque se não é religioso, parecer-lhe-á que é assim. E, se é mulher casada, dir-lhe-á que é melhor, quando haveria de atender à sua casa, estar em oração, ainda que descontente o marido. E assim não saberá ordenar nem o tempo nem as coisas, para que tudo vá conforme à verdade. Por faltar-lhe a ele a luz, não a dá aos outros ainda que queira. E embora pareça que para isto não são precisas letras, a minha opinião foi sempre e será que qualquer cristão procure tratar ― se puder ― com quem as tem boas e, quanto mais, melhor. E os que vão por caminho de oração têm disto maior necessidade, e tanto maior, quanto mais espirituais.

18. E não se engane dizendo que letrados sem oração não são para quem a tem. Tenho tratado com muitos e, de há uns anos para cá, tenho-os procurado mais sendo maior a necessidade e sempre fui amiga deles. E embora alguns não tenham experiência, não aborrecem o espírito nem o ignoram; porque na Sagrada Escritura que estudam, sempre encontram a verdade do bom espírito. Tenho para mim que pessoa de oração que trate com letrados, se ela se não quiser enganar, não a enganará o demónio com ilusões, pois creio que os demónios temem de grande modo as letras humildes e virtuosas, sabendo que serão descobertos e sairão com perda.

19. Disse isto porque há opiniões de que os letrados não são para gente de oração, se não têm espírito. Já disse que é necessário mestre espiritual; mas se este não for letrado, é grande inconveniente. Contudo, será de muita ajuda tratar com eles, desde que sejam virtuosos; porque, embora não tenham espírito, aproveitar-nos-á e Deus lhes dará a entender o que têm de ensinar e até os fará espirituais para nosso proveito. E isto não o digo sem o ter experimentado e aconteceu-me a mim com mais de dois. Digo que, para se render uma alma a estar de todo sujeita a um só mestre, erra muito se não procurar que seja tal como fica dito. Se for religioso, há-de estar sujeito a seu Prelado, a quem porventura faltarão todas as três coisas, ― o que não será já pequena cruz -sem que ele, de sua própria vontade, sujeite o seu entendimento a quem o não tenha bom. Pelo menos disto nunca eu me pude convencer a mim mesma nem me parece que convém. Se é secular, louve a Deus porque pode escolher a quem há-de estar sujeito e não perca esta tão virtuosa liberdade; antes esteja sem nenhum até o encontrar. O Senhor lho dará, desde que vá tudo fundado em humildade e com desejo de acertar. Eu louvo-O muito ― e nós as mulheres e os que não têm letras sempre Lhe havíamos de dar infinitas graças ― por haver quem, com tantos trabalhos, tenha alcançado a verdade que nós, ignorantes, ignoramos.

20. Espantam-me muitas vezes letrados ― religiosos em especial ― com o trabalho com que ganharam o que sem nenhum, mais que o de perguntar, me aproveite a mim. E que haja pessoas que se não querem aproveitar disto! Não o queira Deus! Vejo-os sujeitos aos trabalhos da Religião, que são grandes, com penitência e mau comer, rendidos à obediência que é certo ser-me isto, algumas vezes, de grande confusão e, além disso, mau dormir, tudo trabalho, tudo cruz. Parece-me que seria grande mal se alguém, por sua culpa, perdesse tanto bem. E poderá ser que pensemos alguns dos que estamos livres destes trabalhos e vivendo a nosso prazer, dando-nos eles tudo já guisado ― como se diz ― que, por termos um pouco mais de oração, nos havemos de avantajar a tantos trabalhos.

21. Bendito sejais Vós, Senhor, que tão inábil e sem proveito me fizestes; mas louvo-Vos muito, por despertardes a tantos que nos despertem. Havia de ser mui contínua a nossa oração por esses que nos esclarecem. Que seríamos sem eles entre tão grandes tempestades como agora tem a Igreja? Se alguns tem havido ruins, mais resplandeceram os bons. Praza ao Senhor que os tenha de Sua mão e os ajude para que nos ajudem. Amen.

22. Muito tenho saído propositadamente do que comecei a dizer; mas tudo é a propósito para os que começam, a fim de que comecem caminho tão alto, de maneira a irem metidos no verdadeiro caminho. Pois, voltando ao que dizia, de pensar em Cristo atado à coluna, é bom discorrer um pouco e pensar nas penas que ali teve e por que as teve e quem é Aquele que as teve e o amor com que as passou. Mas não se canse em andar sempre a buscar isto, antes se fique ali com Ele, aquietado o entendimento. Se puder ocupá-lo em ver que o Senhor o olha, e acompanhe-O, e fale, e peça, e humilhe-se, e regale-se com Ele, e lembre-se que não merecia estar ali. Quando puder fazer isto ― embora seja logo de princípio, ao começar a oração, achará grande proveito, pois dá grandes lucros este modo de oração; pelo menos teve-os a minha alma.

Não sei se acerto em o dizer; V. Mercê o verá. Praza ao Senhor acerte eu em O contentar sempre. Amen.