BENVINDOS AO SITE DOS AMIGOS DA BEATA ALEXANDRINA

     


Domingo XXX do Tempo Comum
— A —

Leitura do Livro do Êxodo   (22, 20-26)

Eis o que diz o Senhor :

« Não prejudicarás o estrangeiro, nem o oprimirás, porque vós próprios fostes estrangeiros na terra do Egipto. Não maltratarás a viúva nem o órfão. Se lhes fizeres algum mal e eles clamarem por Mim, escutarei o seu clamor ; inflamar-se-á a minha indignação e matar-vos-ei ao fio da espada. As vossas mulheres ficarão viúvas, e órfãos, os vossos filhos.

Se emprestares dinheiro a alguém do meu povo, ao pobre que vive junto de ti, não procederás com ele como um usurário, sobrecarregando-o com juros.

Se receberes como penhor a capa do teu próximo, terás de lha devolver até ao pôr do sol, pois é tudo o que ele tem para se cobrir, é o vestuário com que cobre o seu corpo. Com que dormiria ele?

Se ele Me invocar, escutá-lo-ei, porque sou misericordioso ».

 

Salmo 17 (18), 2-3.7.47.51ab

Eu Vos amo, Senhor, minha força,
minha fortaleza, meu refúgio e meu libertador.
Meu Deus, auxílio em que ponho a minha confiança,
meu protector, minha defesa e meu salvador.

Na minha aflição invoquei o Senhor
e clamei pelo meu Deus.
Do seu templo Ele ouviu a minha voz
e o meu clamor chegou aos seus ouvidos.

Viva o Senhor, bendito seja o meu protector ;
exaltado seja Deus, meu salvador.
O Senhor dá ao Rei grandes vitórias
e usa de bondade para com o seu Ungido.

 

Leitura da Primeira Epístola do apóstolo São Paulo
aos Tessaloniciens  (1 Tes 1, 5c-10)

Irmãos :

Vós sabeis como procedemos no meio de vós, para vosso bem.

Tornastes-vos imitadores nossos e do Senhor, recebendo a palavra no meio de muitas tribulações, com a alegria do Espírito Santo ; e assim vos tornastes exemplo para todos os crentes da Macedónia e da Acaia. Porque, partindo de vós, a palavra de Deus ressoou não só na Macedónia e na Acaia, mas em toda a parte se divulgou a vossa fé em Deus, de modo que não precisamos de falar sobre ela.

De facto, são eles próprios que relatam o acolhimento que tivemos junto de vós e como dos ídolos vos convertestes a Deus, para servir ao Deus vivo e verdadeiro e esperar dos Céus o seu Filho, a quem ressuscitou dos mortos : Jesus, que nos livrará da ira divina que há-de vir.

 

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo
segundo São Mateus  (22, 34-40)

Naquele tempo ... os fariseus, ouvindo dizer que Jesus tinha feito calar os saduceus, reuniram-se em grupo, e um doutor da Lei perguntou a Jesus, para O experimentar :

« Mestre, qual é o maior mandamento da Lei? »

Jesus respondeu :

« ‘Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todo o teu espírito’. Este é o maior e o primeiro mandamento.

O segundo, porém, é semelhante a este : ‘Amarás o teu próximo como a ti mesmo’.

Nestes dois mandamentos se resumem toda a Lei e os Profetas ».

 

O AMOR DE DEUS E DO PRÓXIMO

A terceira controvérsia de Mt 22 em Jerusalém, que se sucedeu à disputa com os saduceus acerca da ressurreição (22,23-33), coloca Jesus perante um doutor da Lei (w. 34-35). A pergunta versa sobre o maior mandamento da Lei (v. 36). Na resposta Jesus cita e une dois preceitos (w. 37-39), que se encontram em dois livros separados do Antigo Testamento (o amor de Deus e o amor do próximo, cf. Dt 6,6 e Lv 19,18), e completa a resposta com o comentário: «Nestes dois mandamentos se resumem toda a Lei e os Profetas.» (v. 40) Mateus estabelece uma simetria perfeita entre este ensinamento de Jesus e a enunciação da «regra de ouro» no Sermão da Montanha: «Tudo o que desejais que os outros vos façam, fazei-o também a eles. Pois nisso consistem a Lei e os Profetas.» (Mt 7,12) A simetria demonstra a importância que o evangelista atribui ao ensinamento de Jesus acerca do amor.

Um enviado dos fariseus, um doutor da Lei, interroga Jesus «para O experimentar» (v. 35). A prova a que o Mestre é submetido é dupla. Em primeiro lugar, a pergunta diz respeito à interpretação da Lei de Moisés, tarefa difícil, que requer prudência e sabedoria, tanto mais consumadas quanto mais se tinha erguido ao redor da Lei uma «sebe» de regras minuciosas, para impedir a menor violação dela. Em segundo lugar, a pergunta tem um motivo específico. O que está em jogo é o confronto directo entre Jesus e os fariseus. Desde o princípio o Mestre ensinou e pediu que se praticasse uma «justiça» superior à dos escribas e dos fariseus (Mt 5,20), A prova a que os fariseus O submetem pretende, por isso, demonstrar que não é o ensinamento d'Ele, mas sim o deles, que é superior, e assim terem uma desforra que possam desfrutar contra Ele. É por isso que enviam um perito, um doutor da Lei.

Para responder, Jesus não Se baseia em doutrinas de escola nem em decisões de mestres acreditados. Com autoridade soberana, Ele vai buscar ao Antigo Testamento as palavras decisivas e renova-as no Seu carisma de verdade. Ele, que «não veio abolir a Lei e os Profetas», mas dar-lhes pleno cumprimento (cf. Mt 5,17), dá uma resposta em dois momentos separados por uma suspensão cheia de significado. Para satisfazer a pergunta do doutor da Lei não bastaria enunciar a exigência de «amar a Deus». O próprio Jesus o reconhece: «Este é o maior e o primeiro mandamento.» (v. 38) Mas o Filho sabe que a vontade de Deus não foi ainda completamente revelada. Ele conhece também um outro amor que os fariseus – e com eles quantos mais? – se arriscam a menosprezar. Quando tudo parece ter sido dito, faz uma breve pausa, e depois acrescenta: «O segundo, porém, é semelhante a este: "Amarás o teu próximo como a ti mesmo."» (v. 39) O amor de Deus e o amor do próximo tornaram-se inseparáveis, e para sempre. Um não pode aparecer nem crescer sem que a seu lado surja e cresça também o outro.

O amor do próximo, no espírito e na letra de Lv 19,18, devia exprimir-se até "querer bem ao irmão na fé como se ama a própria vida" Nos lábios de Jesus, quem ama deverá perdoar ao irmão «até setenta vezes sete» (Mt 18,22), amar «o perseguidor» e o «inimigo» (cf. Mt 5,43-44). Assim os discípulos serão «filhos do Pai celeste» e «perfeitos como Ele é perfeito» (cf. Mt 5,45-48).

O amor de Deus e o amor do próximo não se colocam «ao lado» de outras normas nem dos oráculos, antes formam a sua base: são a linfa vital que alimenta a Lei os Profetas e impedem que se transformem em letra que mata (cf. 2Cor 3,6; Rm 5,5).

O fio condutor deste domingo é o amor do próximo. A página do «código da aliança» (primeira leitura) dirige o amor do próximo para os excluídos do banquete da vida. A actualidade das directrizes de Ex 22,22-26 é tanto mais clara e vinculadora para nós cristãos, quanto maior cuidado tivermos em as compreender, à luz do Evangelho, no actual quadro histórico. A assembleia é chamada a amar o próximo, a começar pela multidão dos pobres, que já no tempo de Israel atingia números elevados, e hoje muito mais ainda. Além disso, a tríade bíblica as personae miserae («estrangeiros», «órfãos», «viúvas») retrata um modelo que hoje nos pede que identifiquemos não somente as novas expressões de diversidade étnica, cultural e religiosa, mas também as manifestações inéditas da orfandade e da viuvez. As dificuldades de diálogo entre as gerações,

a interrupção da corrente narrativa que transmite aos jovens o melhor das memórias, das tradições e das experiências de adultos e anciãos, geram novos órfãos que procuram noutro lado paternidade, maternidade e histórias substitutivas. Os próprios adultos acusam os sintomas da viuvez: existem «viú­vos» e «viúvas» que vão perdendo a metade de si mesmos. Mas despontam sinais de esperança: iniciativas contra a usura; bancos que oferecem empréstimos com juros razoáveis; oásis de solidariedade.

O mandamento do amor do próximo de Lv 19,18, que Jesus propõe no Evangelho de hoje, não foi concebido numa época de bem-estar nem de eficiência das instituições: no povo de Israel, regressado do exílio, faltavam, porque já extintas ou destruídas, a dinastia, o Templo, e quase todas as estruturas ao serviço do bem comum. O projecto de uma comunidade nova volta a partir dos antigos valores da amizade e do amor na Aliança, que já outrora tinham misturado tribos diversas num só povo de irmãos. O percurso de reconstrução colocou ao lado das primeiras pedras dos edifícios o elo invisível das relações intersubjectivas. A segunda leitura confirma que esta foi uma opção frutuosa para a comunicação da fé, especialmente nos tempos de desalinhamento e de fragmentação dos pertences. A evangelização incide e continua na História através de uma cadeia viva de encontros, capazes de comunicar a experiência do encontro com Deus em Jesus Cristo. A Igreja de Tessalónica é o modelo, em certa medida original, no qual cada geração cristã pode inspirar-se.

O amor de Deus requer o ser humano por inteiro. Nasce do «coração», centro da pessoa, das ideias e das decisões, e infunde-se na «alma», fonte dos afectos, dos sentimentos e das emoções; finalmente, Jesus pede que amemos a Deus «com toda a nossa mente [diánoia]». O amor de Deus con­quista a inteligência, habita com suavidade a mente, dilata os pensamentos, evita os fanatismos e os entusiasmos passageiros, torna familiar aquele que ama com os pensamentos e os caminhos do Senhor. Amar a Deus com toda a mente é ter uma ideia cada vez maior de um Deus cada vez maior.

«Eu Te louvo, Pai, Senhor do Céu e da Terra, porque reve­laste aos pequeninos os mistérios do reino dos céus.» Quem se arroga pretensões de superioridade de doutrina e de disciplina moral não compreende a revelação do duplo amor, porque o Pai «escondeu estas coisas aos sábios e inteligentes e as revelou aos pequeninos» (Mt 11,25). Os «pequeninos» compreendem-na e acolhem-na, porque essa revelação pertence ao mistério do Reino de Deus, e os pequeninos são os humildes e os simples que sabem como aceitar os dons do Pai. Pequeninos são também os que conseguem sentir a necessidade de Deus.

De entre as palavras de Jesus sobre o amor, recolhidas pelo evangelista Mateus, uma admoesta a Igreja de todos os tempos: «Vão surgir muitos falsos profetas que enganarão muita gente. A maldade espalhar-se-á tanto que o amor de muitos se esfriará. Mas, quem perseverar até ao fim, será salvo.» (Mt 24,11-13) Um amor que esfria está perdido. A predição de Jesus é também um acto de misericórdia e uma lição de sabedoria, porque não permite ao amor uma caminhada incontestada e triunfal nesta terra. O Evangelho do amor nem sempre encontrará os discípulos numa situação de sereno gozo de Deus e do próximo. Pelo contrário, o seu amor deverá enfrentar sempre novos dilúvios de injustiça e de indiferença, restabelecer e sarar espaços destruídos pelo ódio, construir baluartes contra a «ira futura» (lTs 1,10).

Padre José Granja,

 

PARA QUALQUER SUGESTÃO OU INFORMAÇÃO