O dia 5
de Janeiro de 1951 foi uma sexta-feira, dia em que a Alexandrina
vivia a Paixão.
Foi um
dia particular para ela, entre alegrias e penas. No seu Diário,
quase ao começá-lo, ela escreveu:
«Ó
meu Deus, tudo por Vosso amor. Por Vós, tudo é alegre, nada é
amargo.»
Como é
sabido, o Dr. Augusto Dias de Azevedo, o médico da Alexandrina,
tinha uma família numerosa e alguns dos seus filhos e filhas
abraçaram a via religiosa, tornando-se freiras ou sacerdotes. Todos,
sem excepção, tinham pela “Doentinha de Balasar” um extremoso
carinho, não somente inculcado pelo pai, mas sobretudo depois que a
Alexandrina, pedindo ao Senhor Jesus, tinha obtido a cura da esposa
do Doutor que sofria de grave doença.
De vez
em quando, um dos filhos do Dr. Azevedo — que era agora jovem
sacerdote — vinha celebrar a Santa Missa no quartinho da
Alexandrina, o que era para esta motivo de júbilo e de agradecimento
sincero. Ela escreveu:
«Ontem de manhã, tive pela segunda vez a Santa Missa celebrada pelo
filho do meu bondoso médico. Rodeavam-me várias pessoas do número
das mais queridas. Sentia-me a mais pobre e indigna entre todas.
Sempre sem saber assistir ao Santo Sacrifício, pedi como de costume
à Mãezinha que assistisse Ela por mim com a Sua sabedoria,
sentimentos e amor. Eu era um cadáver em sepulcro e tudo quanto se
ia passando ia-se sepultando comigo. Meu Deus, tremendo martírio!
Chegou o momento da Sagrada Comunhão, Jesus deu entrada no meu
coração, transformou-mo, fiquei logo outra, mais forte e iluminada
por uma nova luz.»
A alma
repleta destes sentimentos que a tinham “transformado”, que a tinham
feito “outra”, “mais forte e mais iluminada”, ela recebeu a mensagem
do seu amado esposo:
«Minha filha, sou Eu que estou aqui, fui Eu que dei entrada no
tabernáculo do teu coração e meu paraíso de delícias.»
Como
poderia ela ficar indiferente a tão doces e meigas palavras?
O
coração “mais iluminado”, ela ouviu atentamente, com um respeito
todo deliciado, o que o divino Esposo tinha ainda para lhe dizer:
«Eu
quero confortar-te, encher-te e animar-te para mais sofrimentos,
para mais cruz. Sofre, alma heróica e generosa, sofre alegremente,
nada negues ao teu Jesus. Eu quero agradecer-te o teu heroísmo, a
tua generosidade, tudo quanto me tens dado. Quero agradecer também
aos que contigo sofrem e te ajudam no mais doloroso calvário,
esforçando por levar ao fim o triunfo da minha causa. Agradeço tudo,
porque também Eu gosto que a Mim Me agradeçam. Este novo ano será na
causa divina ano de luz e de glória para Mim. Não há rosas sem
espinhos. Por entre elas eles hão-de sobressair, hão-de ferir-te e
ferir os que por meu amor trabalham. Coragem, pois.»
“Também Eu gosto que a Mim Me agradeçam”,
disse-lhe Jesus.
Quantas
vezes nos esquecemos de agradecer ao Senhor um novo dia que Ele
generosamente nos concede? Quantas vezes, depois de Lhe pedirmos uma
graça nos esquecemos de Lhe agradecer, quando a recebemos, como se
isso fosse uma coisa normal? Gravemos nas nossas almas esta frase de
Jesus e, daqui em diante, não nos esqueçamos que Ele também gosta
que Lhe “agradeçam”.
E, para
provar que também gosta de agradecer àqueles que estão sempre
prontos a servi-lo, Jesus continua:
«Diz
ao teu médico um “obrigado” de Jesus só para ele, pelo seu pronto e
fiel auxílio à causa divina, à causa da missão mais sublime. Dá-lhe
em meu nome uma chuva de graças e amor para ele e todos os seus
entes queridos.»
Com
efeito, o Dr. Azevedo dedicou-se a fundo à causa de Jesus
personificada na Alexandrina. Foi um fiel defensor, correu riscos,
mas tudo fez para que a sua “paciente” fosse respeitada e amada por
todos, mesmo aqueles que em certos momentos foram seus inimigos. Em
suma: o Dr. Augusto de Azevedo foi um “santo homem”!
Depois
de ter dita à sua querida esposa o que tinha para lhe dizer, Jesus
chamou sua bendita Mãe, que logo acorreu:
«Vem, minha Bendita Mãe, não deixes sem o teu carinho a nossa
filhinha.»
A
Alexandrina explica agora o que então se passou:
«Veio a Mãezinha, ficou ao meu lado direito, beijou-me,
acariciou-me, tomou-me para o meu regaço, cobriu-me com o seu manto
azul bordado a ouro: era manto de Rainha.
— Minha filha, minha filha, se me queres agradar, faz sempre a
vontade de Jesus, sofre tudo por Ele, pelo mundo, pelos pecadores,
não os deixes ir para o inferno.
Ó
minha filha, ai, o pobre mundo que não me atendeu a Mim nem atendeu
a Jesus! Acode-lhe, acode-lhe, trá-lo sempre no teu coração, no teu
entretenimento de amor, na tua passagem do Coração Divino de Jesus
para o Meu e do Meu para o de Jesus, que tanto nos consola; leva-o
sempre contigo para assim ele estar sempre nos Nossos Divinos
Corações. Não esqueças que foi posto por Nós no teu coração e que a
ti foi confiado. Aceita novamente este manto, todo sob este abrigo.
A
Mãezinha tirou dos seus santíssimos ombros o manto e colocou-o sobre
os meus. Jesus ajudou. Nesta ocasião eu senti como se o mundo
inteirinho estivesse à sombra daquele manto celeste. Num impulso de
amor, bradei:
— Ó
Mãezinha, ó Mãezinha! Ó Jesus, ó Jesus, não o deixais daqui sair; só
assim será poupado, só assim não corre perigo. Perdão Jesus, perdão,
Mãezinha.»
Esta
preocupação de salvar o mundo e as almas estava sempre presente no
coração nobre da Alexandrina, que tudo aceite e pede ainda mais,
para salvar a todos, sem excepção. E, assim “armada” com o Manto da
Mãezinha, ela sentia-se verdadeiramente “transformada, sentiu-se
logo outra, mais forte e iluminada por uma nova luz”.
Alimentada por estes dons divinos ela podia também voltar à sua
missão, à sua cruz quotidiana. Foi o que lhe disse Jesus ao
despedir-se:
«Vai
em paz, esposa minha, vai forte para a cruz. Leva a todos os que te
são queridos o amor de Jesus e da Mãezinha, e diz-lhes em nosso nome
um obrigado celeste. Coragem! Vai em paz!»
A sua
humildade, como habitualmente, levou-a a agradecer, a agradecer por
ter que voltar à sua cruz, ao seu sofrimento, à reparação, para a
salvação das almas, de muitas almas:
«Obrigada, Jesus; obrigada, Mãezinha!»
Procuremos nós também, a viver debaixo do Manto de Maria, porque ele
é o melhor abrigo que possamos ter, para estarmos protegidos dos
assaltos do inimigo das nossas almas, e para continuarmos fieis aos
preceitos divinos que tantas e tantas vezes esquecemos.
Saibamos também dizer “OBRIGADO” como Jesus.
Afonso
Rocha |