Relutante em casar aos
16 anos, viúva com um pouco mais de 30, expulsa de casa pelos
parentes do marido, nos restantes 50 anos de sua vida foi obrigada a
viver sem abrigo. Tantos percalços estão concentrados na vida da
Beata Joana Maria de Maillé que nasceu rica e mimada no Castelo de
La Roche, perto de Saint-Quentin, Touraine, em 14 de Abril de 1331.
Seus pais eram o Barão de Maillé Hardoin e Joana, filha dos Duques
de Montbazon.
Sua
família se destacava pela devoção. Ela cresceu sob a orientação
espiritual de um franciscano, mostrando uma particular devoção a
Maria. Dedicava-se a orações prolongadas e fez precocemente o voto
de virgindade. Aos onze anos, no dia de Natal, pela primeira vez
teve um êxtase: Maria Santíssima lhe apareceu segurando em seus
braços o Menino Jesus. Uma doença que quase a levou à morte serviu
para desprendê-la mais e mais da terra e torná-la mais próxima de
Deus.
Na idade de dezasseis
anos, aparece no cenário de sua vida um parente da mãe que se tornou
seu tutor, o que sugere que os pais morreram prematuramente. O tutor
combina, de acordo com o costume da época, o casamento de Joana com
o Barão Roberto II de Sillé, um bom jovem, não muito mais velho do
que ela, seu companheiro de brincadeiras na infância. E isto apesar
de estar ciente da inclinação de Joana para a vida religiosa e do
seu voto de castidade. Portanto, é um casamento contra a vontade da
jovem.
Providencialmente, o
tutor morreu repentinamente na manhã do dia do casamento, e a
impressão no noivo foi tão grande, que propôs a Joana viverem em
perfeita continência, isto é, como irmão e irmã. Seu consentimento é
imediato, já que estava preparada para isto pelo seu voto de
virgindade.
Apesar das premissas, o
casamento funcionou e bem: como base da união eles colocaram o
Evangelho, e viveram-no plenamente, resultando em muitas boas obras,
como: adoptar algumas crianças abandonadas, alimentar e cuidar dos
pobres, ajudar os empestados... Na verdade, tinham muito que fazer.
Nunca se viu tanto movimento no castelo desde que se espalhou a
notícia de o casal ser extremamente caridoso.
E pensar que não lhes
faltaram problemas, como quando Roberto teve que ir para a guerra (estamos
na época da Guerra dos Cem Anos), onde foi ferido e preso pelos
britânicos. Para libertá-lo Joana pagou um resgate elevado, o que
afectou fortemente o património do casal. No entanto, eles não
perderam a fé, e uma vez instalados, marido e mulher, lado a lado,
primeiro tratam dos contagiados pela peste negra, depois, dos
leprosos.
Roberto morreu em 1362
e Joana, viúva aos 30 anos, vê toda a família de seu marido se
voltar contra ela. A principal acusação: ter esbanjado a fortuna da
família. Assim, ela foi expulsa do Castelo de Silly e ficou sem
casa, sem um tostão, forçada a viver da caridade. Mas, mesmo na rua,
os parentes ricos continuavam a persegui-la: enviavam seus serviçais
para lançar-lhe insultos quando ela passava, porque não queriam
rebaixar-se a fazê-lo pessoalmente.
Ela renunciou a todos
os seus bens e foi morar em um casebre construído junto ao convento
dos Frades Menores Franciscanos de Tours, onde levava uma vida de
penitência, contemplação e pobreza contínua, a mendigar o pão.
Gozou de várias aparições da Virgem Maria, de São Francisco e de
Santo Ivo, o qual lhe recomendou que ingressasse na Ordem Terceira
de São Francisco.
Joana sofria e, com um
amor sem limites, não tinha um mínimo de ressentimento. E para
sabermos onde ela encontrava tal força e tanta bondade, olhemos para
suas longas horas de oração, sua grande penitência, seus sacrifícios.
Escolheu para vestir uma túnica grosseira e rude, muito semelhante à
roupa de seus amados franciscanos, de cuja intensa espiritualidade
viveu.
Continuou a fazer
caridade com os doentes e os prisioneiros condenados à morte, se não
já com dinheiro, mas com a sua presença e seus humildes serviços,
consolando-os quando não podia fazer nada melhor, e intercedendo
pela sua libertação quando atingiu popularidade e pode usá-la em
proveito do próximo.
Devido a sua reputação
como uma mulher de Deus se ter espalhado pela França, muitos a
procuravam pedindo conselhos, e entre aqueles que bateram à sua
porta havia também alguns daqueles que a tinham insultado
antigamente e que ela recebia com amor e paciência.
O rei de França, Carlos
VI, que estava em Tours, foi visitar a penitente famosa que lhe
pediu para libertar alguns prisioneiros e dar a outros a ajuda de um
capelão.
Em 1395, Joana mudou-se
para Paris onde se encontrou outra vez com o rei da França, Carlos
VI e sua esposa, Isabel da Baviera. Ela aproveitou a oportunidade
para criticar o luxo da corte e a vida licenciosa dos cortesãos. Em
Paris, visitou a Sainte-Chapelle para venerar as relíquias da Paixão
de Cristo.
Apesar da frágil saúde
e das dificuldades da sua vida penitente, Joana atingiu a idade de
82 anos e morreu em 28 de marco de 1414 cercada de uma sólida
reputação de santidade e foi sepultado na igreja franciscana.
Infelizmente o seu túmulo foi profanado pelos calvinistas nas
guerras de religião.
A sua fama de santidade
era tão difundida, que os fiéis a veneravam espontaneamente. Como
resultado, em apenas 12 meses foi instaurado o processo diocesano
informativo para sua canonização. Mas, mesmo após a morte Joana tem
que esperar: a sua beatificação só ocorreu muito mais tarde, em
1871, pelo Papa Pio IX.
Aparição de Santo
Ivo à Beata Joana Maria de Maillé
A Beata relatou uma
visão de São Ivo em uma época difícil de sua vida. A jovem baronesa
tinha ficado viúva e fora expulsa do seu castelo pelos parentes, que
alegavam que ela tinha encorajado a excessiva caridade de seu esposo,
em detrimento do novo herdeiro. Após ser maltratada, inclusive pelo
serviçal a quem tinha dado refúgio, ela voltou para a sua família em
Tours.
A aparição é contada
por dois historiadores da Ordem Terceira. São Ivo “aconselhou-a a
deixar o mundo e a tomar o hábito que ele estava usando”. Outro
biógrafo diz: “Se vós deixardes o mundo, gozareis, mesmo aqui na
Terra, as alegrias do Paraíso”.
Os mesmos autores
especulam se Joana não hesitou diante da perspectiva de renunciar a
tudo. “Pobre pequena baronesa! Ela ficou amedrontada diante da
prometida liberdade da pobreza e acreditou que poderia desfrutar da
paz no último refúgio, seu lar. Mas a vontade de Deus era outra”.
Joana deve mesmo ter
hesitado, pois somente depois de uma visão de Nossa Senhora, que
repetiu o mesmo conselho, é que ela tomou o hábito da Ordem Terceira
de São Francisco. |