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Exame de consciência

No dia 13 de Maio de 1943, aniversário da primeira aparição da Virgem em Fátima, a Alexandrina parece fazer, na página do Diário que nesse dia mandou escrever, uma espécie de exame de consciência.

Será importante lembrar que desde 7 de Janeiro do passado ano de 1942, não tinha guia espiritual : o Padre Mariano Pinho tinha sido proibido pelos seus superiores de se “ocupar” da Alexandrina. Este golpe terrível será uma chaga aberta que ela conservará no seu coração até ao fim da sua vida. Ela queixa-se meigamente ao Senhor :

“Tende de mim compaixão, vede que os homens levaram para longe de mim aquele que me guiava por caminho direito e seguro ao vosso divino Coração”.

Se uma das suas missões tinha já sido realizada ― a consagração do mundo ao Coração Imaculado de Maria ― a sua vida mística continuava ardente e outras missões continuavam a fazer parte do seu dia à dia, particularmente os sacrários abandonados, junto dos quais ela devia orar e pedir ao Senhor pelos pecadores endurecidos : amar por aqueles que não amam, orar por aqueles que não oram, sofrer por aqueles que não aceitam sofrer par bem dos irmãos mais necessitados do ponto de vista espiritual.

E, a guerra mundial continuava então a fazer numerosas vítimas, pelas quais era também necessário rezar... E Portugal, a terra de Santa Maria, podia ainda ser “obrigado” a participar neste terrível conflito...

Todas estas “coisas”, todos estes factos eram motivo de preocupação para a Beata Alexandrina e motivo de “meditações”, quase sempre dolorosas.

A mais disto, as línguas do povo não se calavam : falava-se da “Doentinha de Balasar” a torto e a direito ; diziam-se coisas que nada tinham a ver com a mais rudimentar caridade cristã e, estes dizeres do povo, mesmo calúnias descaradas, faziam sofrer a pobre vítima do Calvário de Balasar.

“Quantos me odeiam e desprezam ! Quantos me caluniam ! A interrogar-me a mim mesma dizendo : Que mal lhes fiz eu ?”

Ela precisa de “força para desabafar com Jesus”, coragem para continuar a sua missão “venha o que vier”, mas este “desabafar” e esta vontade de “passar além da dor”, não a impedem de se encontrar “na noite mais escura e nos sofrimentos mais agudos e profundos”.

“Nem ao menos vós, meu Jesus, baixais do Céu à terra vindo ao meu quartinho pelo santo Sacrifício da Missa. Que saudade, que pena: tudo me roubaram!”

Chegam momentos de quase desânimo, mas ela não desanima, porque sabe que Jesus está com ela, mesmo quando ela o não sente e, quando o não sente, ela chama por Ele, solicita a sua ajuda salutar : “Meu Deus, se me faltais, não tenho ninguém !” Mas Ele nunca lhe faltará : estará sempre presente, sempre pronto a colhê-la em seus divinos braços e a encorajá-la, lembrando-lhe a missão confiada : os sacrários e as almas.

Todavia, ela não deixa de confiar, de insistir, de pedir : “Mas com tudo isto confio em vós. Deixai que a minha confiança vá tão longe quanto pode ir : deixai que ela aumente na medida do possível”.

Corajosa e, como para conjurar esse estado em que então se encontra, ela reage com força e ânimo : “Viver e morrer convosco como é doce, meu Jesus ! Que mais virá ainda ? Venha o que vier, presa com as cadeias do vosso amor nada temo”.

Era assim a Beata Alexandrina, mulher forte e decidida, mesmo quando a dor aperta, mesmo quando o caminha estreita, mesmo quando já não tem forças para mais, consegue, pela sua fé intrépida e redobrar de coragem, a dar um novo impulso e a ir mais além, para além da dor !

― “Que sou eu sem Jesus ?...”

E nós, que somos nós sem Ele ?

* * * * *

« Jesus dai-me força para mais esta vez desabafar convosco. É a filhinha que vem a seu Pai a pedir auxílio para a luta da vida. Se os espinhos que me ferem e a montanha íngreme do meu calvário me levam ao maior dos desalentos, deixando-me por terra na noite mais escura e nos sofrimentos mais agudos e profundos. Por outro lado, a voz doce e suave que repetidas vezes se me faz ouvir (“Coragem, minha filha, que é por mim ; anima-te que é Jesus”) obriga a levantar-me e a caminhar com canseira. Chama-me Jesus, Ele quer as suas almas. E para onde caminho ? Pobrezinha que eu sou, que ceguinha que nada vejo. Depois de levantar-me não tenho luz no caminho, não ouço a vossa divina voz que me chama. Meu Deus, se me faltais, não tenho ninguém ! Tende de mim compaixão, vede que os homens levaram para longe de mim aquele que me guiava por caminho direito e seguro ao vosso divino Coração. Quantos me odeiam e desprezam ! Quantos me caluniam ! A interrogar-me a mim mesma dizendo: Que mal lhes fiz eu ? Logo me vem ao pensamento : Que mal nos fez Jesus a não ser amar-nos e morrer por nós ? E logo me sinto obrigada a perdoar-lhes e a repetir muitas vezes : Perdoai-lhes, meu Jesus, permiti que se convertam e se abrasem no vosso divino Amor. Mas só vós, meu amor, sabeis a minha dor e amargura. Sinto-me sozinha ! Pegou em mim um incêndio que tudo queimou e destruiu. Tudo perdi. Nem ao menos vós, meu Jesus, baixais do Céu à terra vindo ao meu quartinho pelo santo Sacrifício da Missa. Que saudade, que pena: tudo me roubaram ! Tende dó, Jesus, deste pequenino sopro de vida que já não é como um agonizante que de momentos a momentos sempre pode respirar. Vede, Jesus, é pior ainda. A minha respiração é mais tardia, parece-me demorar dias e dias ; e assim vou perdendo a vida. Estou como uma luz que se apaga para nunca mais se acender. Os meus olhos parece-me que perderam a luz da terra ; não posso viver a vida humana. Mas com tudo isto confio em vós. Deixai que a minha confiança vá tão longe quanto pode ir : deixai que ela aumente na medida do possível. Foi nos vossos santíssimos braços que me entreguei e no vosso santíssimo coração que fiz a minha morada. Viver e morrer convosco como é doce, meu Jesus ! Que mais virá ainda ? Venha o que vier, presa com as cadeias do vosso amor nada temo. A tempestade não cessa. Ouço o zunir dos ventos furiosos e destruidores. Ouço o eco do trovão que tudo faz tremer. Deixai-me ó Jesus, ou antes permiti que eu fite para sempre o meu olhar nos vossos divinos olhares para nunca mais de vós os retirar, para ver todo o martírio como vindo de vós, e nada temer, ser forte convosco. Temer só o pecado e ter sempre diante de mim a minha miséria. Que sou eu sem Jesus ? Como lhe tenho correspondido ao amor sem igual com que tenho sido amada ? Pobre de mim ! Como ousei ofender-vos ? »[1]


[1] Sentimentos da alma :  13 de Maio de 1943.

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